Aprendizes da diferença, por Tolentino Mendonça
O Evangelho de Lucas traz um episódio desconcertante em relação à Sagrada Família de Nazaré: Maria e José perdem de vista Jesus, procuram-no em vão entre parentes e familiares, e no fim encontram-no, com grande espanto, num contexto que não esperavam (no templo, enquanto discutia com os doutores da lei).
Quando lhe pedem uma explicação, não apreendem aquela que Ele lhes dá. Mas todos regressam a casa.
No fundo, este é um episódio menos enigmático do que pode parecer, porque a família é o espaço em que acolhemos uma verdade uns dos outros que nem sempre chegamos a compreender.
A família é certamente o lugar onde nos reencontramos, mas também o lugar em que nos perdemos. Por isso, na comunidade familiar devemos sempre procurar-nos, porque não sabemos dizer onde o outro se encontra.
A beleza da família está neste aprendizado sereno da diferença, na arte de guardar aquilo que não se compreende e que, provavelmente, não era o sonho inicial.
Não devemos pressupor que a família é um horizonte de fusão em nunca se verificarão problemas ou feridas. Pelo contrário. É talvez por causa da família que sobre o nosso rosto cairão as lágrimas mais difíceis que cada um de nós terá de chorar.
Mas o segredo é abraçar tudo isto sem nos desencorajarmos, sentindo-nos dentro de uma espécie de dança que, ainda que nos esvazie, ao mesmo tempo enche o nosso copo até acima, até transbordar.