Porquê a mim?!
Esta é a pergunta que mais nos aproxima uns dos outros. Conseguimos, sem dificuldade, encontrar o momento em que colocámos os olhos no Céu e perguntámos:
Porquê a mim?!
Se nos detivermos nas palavras que formam a pergunta em questão, pouco nos sobrará para dizer ou comentar. É exatamente o que está no avesso das palavras que se pronunciam ou repetem. Esta pergunta é, na verdade, um esconderijo extraordinário. Uma gruta demasiado pequena para os universos que lá cabem dentro.
Porquê a mim?!
Não nos é possível encontrar entendimento suficiente para a resposta e, muito menos, para a dor que está na origem da pergunta. Não fazemos a mínima ideia do motivo que nos leva a ser obrigados a atravessar este ou aquele sofrimento. Esta ou aquela perda. Esta ou aquela desilusão. Esta ou aquela traição. Esta ou aquela falta de fé. Não nos é possível compreender (sempre) as circunstâncias que nos queimam os dias e nos retiram a esperança que achámos que nunca desapareceria.
Porquê a mim?!
Colocamos tudo em causa. Desapertamos os botões das certezas e deixamo-las voar para as ver, depois, desaparecer como pó. Não somos capazes de nos confrontar com os abismos que a vida nos coloca diante dos olhos e do coração. Não fomos feitos para apreciar abismos. Nem finitudes. Fomos feitos para amar paisagens que continuam ou que podemos continuar. Estamos por fazer, por amar, por perdoar, por acontecer. E é por isso que nos recusamos a aceitar o caos que, em determinados momentos, nos domina e desconstrói.
Porquê a mim?!
Terá sido por não ter conseguido ser mais forte? Terá sido por não ter sido capaz de perdoar o meu irmão? Terá sido pelas faltas de paz de que fui culpado? Terá sido pelas vezes em que não acreditei? Terá sido pelas vezes em que não fui tão bom ser humano como devia ter sido?
Não. Não foi por nada disso. O que nos acontece não é sempre culpa nossa nem tem sempre uma razão transparente. Somos postos à prova diariamente. Colocamo-nos perante becos sem saída e perante perguntas sem respostas possíveis. Esta é uma delas. Não sei porque nos acontece o que nos acontece. Não sei porque conhecemos os que conhecemos. Não sei porque vamos ficando como somos. Mas sei que enquanto estamos a obter uma resposta impossível, estamos (também) a perder tempo. E o tempo não existe para se perder. Só existe para se ganhar. Para nos fazer ganhar. Do sofrimento, do caos e do escuro também podem nascer graças. As mais raras. As mais improváveis. Mas também as mais valiosas. Talvez nos nasça força se arriscarmos transformar a pergunta.
Porque não a mim?!