Solenidade de Maria Santíssima Mãe de Deus, homilia

Vaticano 2 janeiro 2023  •  Tempo de Leitura: 10
Santa Mãe de Deus! Era a aclamação jubilosa do Povo santo de Deus, que ressoava pelas ruas de Éfeso no ano quatrocentos e trinta e um, quando os Padres do Concílio proclamaram Maria, Mãe de Deus. Trata-se dum dado essencial da fé, mas sobretudo duma notícia maravilhosa: Deus tem uma Mãe e, por conseguinte, está ligado para sempre à nossa humanidade, como um filho à mãe, a ponto de a nossa humanidade ser a sua humanidade. É uma verdade tão clamorosa e consoladora que o último Concílio, aqui celebrado, afirmou: «Pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-Se de certo modo a cada homem. Trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-Se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado» (Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. Gaudium et spes, 22). Eis o que fez Deus com o seu nascimento de Maria: mostrou o seu amor concreto pela nossa humanidade, abraçando-a real e plenamente. Irmãos, irmãs, Deus não nos ama só com palavras, mas com factos; não nos ama lá «do alto», de longe, mas «de perto», precisamente de dentro da nossa carne, porque em Maria o Verbo Se fez carne e, no peito de Cristo, continua a bater um coração de carne, que palpita de amor por cada um de nós!

 

Santa Mãe de Deus! Muitos livros e grandes tratados se escreveram sobre este título; mas estas palavras entraram no coração do santo Povo de Deus sobretudo com a oração mais familiar e doméstica que acompanha o ritmo dos dias, os momentos mais duros e as esperanças mais ousadas, ou seja, a Ave Maria. De facto, depois dalgumas frases tiradas da Palavra de Deus, começa assim a segunda parte desta oração: «Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores…». Esta invocação marcou muitas vezes os nossos dias e permitiu que, através de Maria, Deus Se aproximasse das nossas vidas e da nossa história: rezada nas mais diversas línguas, desfiando as contas do terço e nos momentos de necessidade, diante duma Imagem sacra ou caminhando pela estrada. A esta invocação – Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores –, a Mãe de Deus sempre responde! Escuta os nossos pedidos, abençoa-nos com o seu Filho nos braços, traz-nos a ternura de Deus feito carne; numa palavra, dá-nos esperança. E, no início deste ano, precisamos de esperança, como a terra precisa de chuva. O ano, que se abre sob o signo da Mãe de Deus e nossa, diz-nos que a chave da esperança é Maria, e a antífona da esperança é a invocação Santa Mãe de Deus. E hoje confiamos à nossa Mãe Santíssima o amado Papa emérito Bento XVI para que o acompanhe na sua passagem deste mundo para Deus.

 

Rezemos à Mãe de modo especial pelos filhos que sofrem e já não têm a força de rezar, por tantos irmãos e irmãs atingidos pela guerra em tantas partes do mundo, que vivem estes dias de festa na escuridão e ao frio, na miséria e no medo, submersos na violência e na indiferença! Por quantos não têm paz, aclamemos Maria, a mulher que trouxe ao mundo o Príncipe da paz (cf. Is 9, 5; Gal 4, 4). N’Ela, Rainha da paz, realiza-se a bênção que ouvimos na primeira Leitura: «O Senhor volte para ti a sua face e te dê a paz» (Nm 6, 26). Pelas mãos duma Mãe, a paz de Deus quer entrar nas nossas casas, nos nossos corações, no nosso mundo. Mas como fazer para a acolher?

 

Deixemo-nos aconselhar pelos protagonistas do Evangelho de hoje, os primeiros que viram a Mãe com o Menino: os pastores de Belém. Eram pessoas pobres, talvez até bastante rudes e, naquela noite, estavam de serviço. Foram precisamente eles, não os sábios nem mesmo os poderosos, os primeiros a reconhecer o Deus próximo, o Deus que veio pobre e gosta de estar com os pobres. Dos pastores, o Evangelho começa por destacar dois gestos muito simples, mas que não são sempre fáceis: os pastores foram e viram. Dois gestos: ir e ver.

 

Em primeiro lugar, ir. O texto diz que os pastores «foram apressadamente» (Lc 2, 16). Não ficaram parados. Era noite, tinham os seus rebanhos para cuidar e estavam certamente cansados: poderiam aguardar a aurora, esperar pelo nascer do sol para ir ver um Menino deitado numa manjedoura. Mas não; foram apressadamente, porque, em presença de coisas importantes, é preciso reagir prontamente, não adiar, pois «a graça do Espírito não tolera a lentidão» (Santo Ambrósio, Comentário sobre São Lucas, 2). E assim encontraram o Messias, o esperado que há séculos muitos procuravam.

 

Irmãos, irmãs, para acolher Deus e a sua paz, não se pode ficar comodamente parado à espera que as coisas melhorem. É preciso levantar-se, aproveitar as oportunidades da graça, ir, arriscar. É preciso arriscar. Hoje, no início do ano, em vez de ficarmos a pensar e esperar que as coisas mudem, será bom interrogar-nos: «Eu, neste ano, aonde quero ir? A quem vou fazer bem?» Muitos, na Igreja e na sociedade, esperam o bem que tu, e só tu, podes proporcionar, o teu serviço. E hoje, face à preguiça que anestesia e à indiferença que paralisa, frente ao risco de nos limitarmos a ficar sentados diante dum ecrã com as mãos no teclado, os pastores desafiam-nos a ir, a comover-nos com o que acontece no mundo, a sujar as mãos na realização do bem, a renunciar a toda uma série de hábitos e comodidades para nos abrirmos às novidades de Deus, que se encontram na humildade do serviço, na coragem de prestar cuidados. Irmãos e irmãs, imitemos os pastores: vamos!

 

Diz o Evangelho que, tendo chegado, os pastores «encontraram Maria, José e o menino deitado na manjedoura» (2, 16). E observa em seguida que, só «depois de [O] terem visto» (2, 17), começaram, cheios de maravilha, a contar aos outros o que lhes tinham dito de Jesus e a glorificar e louvar a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto (cf. 2, 17-18.20). O ponto de viragem deu-se ao tê-Lo visto. É importante ver, abraçar com o olhar, permanecer ali, como os pastores, diante do Menino nos braços da Mãe. Sem dizer nada, sem perguntar nada, sem fazer nada. Olhar em silêncio, adorar, regalar os olhos com a ternura consoladora de Deus humanado e da sua e nossa Mãe. No início do ano, entre tantas novidades que quereríamos experimentar e as inúmeras coisas que quereríamos fazer, incluamos a de dedicar tempo a ver, ou seja, a abrir os olhos e mantê-los abertos diante daquilo que conta: Deus e os outros. Tenhamos a coragem de nos abrir à maravilha do encontro, que é o estilo de Deus; uma coisa muito diferente da sedução do mundo, que te tranquiliza. A maravilha de Deus, o encontro dá-te paz; o mundo consegue apenas anestesiar-te e pôr-te tranquilo.

 

Quantas vezes, levados pela pressa, não temos tempo sequer de parar um minuto na companhia do Senhor para ouvir a sua Palavra, rezar, adorar, louvar! E o mesmo acontece em relação aos outros: levados pela pressa ou pelo protagonismo, não temos tempo para escutar a esposa, o marido, para conversar com os filhos, para lhes perguntar como se sentem dentro, e não só como vão os estudos e a saúde. Faz muito bem deter-se a escutar os idosos, o avô e a avó, para ver a profundidade da vida e redescobrir as raízes. Sendo assim, perguntemo-nos se somos capazes de ver quem vive ao nosso lado, quem mora no nosso prédio, quem encontramos diariamente pela estrada. Irmãos e irmãs, imitemos os pastores: aprendamos a ver! A compreender com o coração, vendo. Aprendamos a ver.

 

Ir e ver. Hoje o Senhor veio para o meio de nós e a Santa Mãe de Deus coloca-O diante dos nossos olhos. Redescubramos, no ímpeto de ir e na maravilha de ver, os segredos para fazer verdadeiramente novo este ano, e vencer o cansaço que te faz instalar ou a paz falsa da sedução.

 

E agora, irmãos e irmãs, convido-vos todos a olhar para Nossa Senhora. Aclamemo-la três vezes «Santa Mãe de Deus!», como fazia o povo de Éfeso: Santa Mãe de Deus! Santa Mãe de Deus! Santa Mãe de Deus!

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