A única arma
Em Bangassou o ódio parece estar à solta nas ruas, nos bairros, em todo o lado. Todos estão debaixo da mira das armas. Nem a Igreja escapa. Todas as semanas há relatos de violência, destruição, assassinatos… É raro o dia em que não se escuta um grito de alarme, um pedido de ajuda. Em Bangassou, todos temem um massacre. Só ninguém sabe dizer quando vai acontecer…
No passado dia 19 de Janeiro, o Padre Yovane Cox, um missionário chileno que está actualmente na Diocese de Bangassou, na República Centro-Africana, enviou uma mensagem aflitiva para a Fundação AIS: “A catedral está a ser atacada”. Uma vez mais, grupos armados andavam à solta pelas ruas, perante a aparente inacção das forças de segurança das Nações Unidas. Como explicava o Padre Cox, este é um país paralisado pelo medo, em que “os assassinatos e os massacres continuam a estar na ordem do dia”. Os terrenos adjacentes à catedral estão ocupados desde Maio do ano passado com centenas de muçulmanos. Estão ali em busca de protecção. São muçulmanos mas só conseguiram encontrar refúgio na Igreja. Do lado de fora dos muros da catedral estão homens armados à espera que alguém saia. É a caça ao homem. Quando enviou a sua mensagem, o Padre Cox afirmou que estariam ali cerca de mil pessoas. Homens, mulheres e crianças. A República Centro-Africana está em guerra desde 2013, com bandos armados que de digladiam mutuamente: os ‘seleka’ e os ‘anti-balaka’. Pelo meio, estão as populações indefesas e aterrorizadas. Por várias vezes o Padre Cox usa a palavra “caos” para se exprimir. A situação atingiu um ponto tal, em especial na Diocese de Bangassou, que a maior parte das escolas estão encerradas “por causa da violência e, sobretudo por causa da falta de segurança”. As escolas estão fechadas e a maior parte das paróquias está também com as portas encerradas. Ninguém está seguro em lugar algum.
Descontrolo total
Ninguém manda neste país africano. Ninguém controla os bandos armados. Nem o Governo, nem as Nações Unidas, nem as autoridades locais, nem a Igreja Católica. Apesar da situação ser explosiva, a Igreja continua presente, junto das populações, procurando acudir às situações mais dramáticas. “Não há mais ninguém”, afirma, desolado, o Padre Cox. “Foram-se todos embora. Os últimos a partir foram os Médicos Sem Fronteiras.” A Igreja Católica tem procurado mediar este conflito, mas é praticamente impossível negociar seja o que for com grupos armados sedentos de sangue, de violência e de morte. No final do mês de Agosto, D. Juan Aguirre, Bispo de Bangassou, denunciava também à Fundação AIS a situação de descontrolo total em que se encontrava a região. O ataque de um grupo islâmico a uma missão em Gambo, na sua diocese, provocou, na ocasião, 40 mortos. Foram quase todos degolados. Na República Centro-Africana, apesar do caos e do ódio à solta, ainda há quem, apesar disso, sonhe em oferecer a sua vida ao serviço dos outros: dos mais pobres, dos mais necessitados. Como disse o Padre Gazzera, um carmelita que já esteve em Portugal a convite da Fundação AIS, “a nossa única arma é a oração”. E é com essa “única arma” que a Igreja tem continuado a sarar feridas na República Centro-Africana. Todas as organizações de ajuda humanitária já abandonaram o país. Ficaram apenas os padres e as irmãs. Mais ninguém. A presença deles é absolutamente vital. Mas eles estão sem meios, de mãos vazias. Muitas destes padres e irmãs só conseguem sobreviver graças ao apoio diário fornecido através da generosidade dos benfeitores da Fundação AIS. Em Bangassou, todos temem um massacre. Só ninguém sabe dizer quando vai acontecer… E os padres e as irmãs têm apenas uma arma: a oração. Eles contam connosco. Eles precisam de si. Agora…