AIS: Sete tiros

Notícias 5 março 2020  •  Tempo de Leitura: 4

Foi atingida a tiro pelas costas. Leonella regressava a casa depois de um dia na escola de enfermagem em Mogadíscio, onde leccionava, quando dois homens dispararam sobre ela. Foram sete tiros. A irmã não morreu logo. Ainda a levaram para o hospital, mas era já impossível salvá-la. As suas últimas palavras dizem muito do que foi a sua vida: “Perdoo, perdoo, perdoo”.

 

Leonella Sgorbati nasceu em Itália, mas passou grande parte da sua vida em África. Primeiro no Quénia e mais tarde na Somália. Partiu para África aos 30 anos e despediu-se da vida, em Mogadíscio, esvaindo-se em sangue, aos 65 anos de idade. Morreu no meio da rua, a um domingo, 17 de Setembro de 2006. O muçulmano Mohammed Osman era o seu guarda-costa. Estava a seu lado. Ainda tentou colocar-se entre Leonella e os terroristas. Casado, tinha quatro filhos. Morreu também. Passavam 30 minutos do meio-dia. Leonella Sgorbati, das Missionárias da Consolata, era bem conhecida. Na capital da Somália, onde foi assassinada, praticamente não há cristãos. Nem em Mogadíscio nem no resto do país. Os atentados são comuns e o país está debaixo de controlo de milícias jihadistas e de senhores da guerra, donos de verdadeiros exércitos do mal. Já havia um clima de profunda violência em Mogadíscio em 2001, quando a Irmã Leonella aceitou o desafio de abrir uma escola de enfermagem. Mas ela parecia não ter medo. Foi. Para trás deixava o Quénia. Abraçar desafios era a sua vocação. Leonella Sgorbati existia para servir. Tinha 23 anos quando ingressou no instituto das Missionárias da Consolata. A vontade de servir levou-a a estudar enfermagem em Inglaterra. Foi já nessa dupla condição de irmã e enfermeira que partiu para o Quénia, onde viria a ser superiora-regional da congregação. Os que a acompanharam nesses anos recordam-se do seu entusiasmo, da forma como tratava os doentes e como se empenhava na formação das jovens enfermeiras.

 

Fé em silêncio

 

Era um exemplo. Talvez por causa do seu entusiasmo, Leonella seria convidada a abraçar um novo desafio. Criar uma escola de enfermagem na Somália. Ninguém desconhecia os riscos do empreendimento. Ela própria sabia que o país estava minado por grupos radicais que pretendiam impor uma visão extremista do Islão. Desde o início que o trabalho da Irmã Leonella Sgorbati foi visto com desconfiança. Diziam que ela usava a escola para catequisar os jovens estudantes. Claro que isso seria uma enorme imprudência num país em que os poucos cristãos têm de viver a sua fé em silêncio, quase clandestinamente. A casa das irmãs – ao todo eram cinco religiosas – tinha então o único sacrário presente em todo o país. A Somália era mesmo um território hostil para os Cristãos. Era e continua a ser. Foi neste contexto que aconteceu o assassinato da irmã. Era domingo, de manhã, quando a irmã deixou a casa comunitária a caminho das aulas. Despediu-se alegremente com a promessa de que haveria polenta para o almoço. Passavam 30 minutos do meio-dia quando regressou. Estava quase a abrir o portão da casa quando se escutou o barulho brutal de uma rajada de metralhadora. As irmãs sobressaltaram-se e correram para a rua. Havia já uma poça de sangue em volta do corpo de Leonella. A seu lado jazia Mohammed Osman. Leonella não morreu logo. Ainda a levaram para o hospital mas já era impossível salvá-la. As suas últimas palavras dizem muito do que foi a sua vida: “Perdoo, perdoo, perdoo”. Uma cruz que pertencia à Irmã Leonella Sgorbati está, desde 2008, na Basílica de São Bartolomeu, em Roma, dedicada aos mártires dos séculos XX e XXI. O processo de beatificação da irmã enfermeira foi aberto em 2013.

Fundação de direito pontifício, a AIS ajuda os cristãos perseguidos e necessitados.

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