O fanatismo da caridade
Grupos de jihadistas tomaram de assalto a cidade de Marawi, no sul das Filipinas e andaram literalmente à caça de cristãos. Alguns foram raptados, outros mortos. Mas muitos conseguiram escapar graças à solidariedade e à coragem de muçulmanos para quem a vida humana está acima de tudo.
Num par de horas, a cidade de Marawi, no sul das Filipinas, transformou-se num campo de batalha. No dia 24 de Maio, terroristas, ligados ao auto-proclamado Estado Islâmico irromperam pelas ruas, aos tiros. Num par de horas, atacaram a cadeia, saquearam todo o armamento que lá se encontrava e, em seguida, dirigiram-se para a Catedral e raptaram o Padre Teresito Suganob e outros quinze cristãos que se encontravam no templo a rezar. Depois, destruíram imagens de santos, derrubaram a cruz, vandalizaram o altar e deitaram fogo ao edifício. Os terroristas pretendem a criação de um califado na região sul do país e não esconderam, logo nas primeiras horas do ataque, que seriam impiedosos para com todos os não-muçulmanos. O que eles não imaginavam é que seriam muçulmanos, arriscando a própria vida, a defender os cristãos de Marawi. O que se passou nesse dia 24 de Maio dificilmente será esquecido por Farida, uma muçulmana que tem uma loja na cidade e que se sentiu completamente impotente quando os terroristas irromperam na sua loja. Ela sabia que seria uma estupidez tentar impedir que eles esvaziassem as prateleiras da sua loja, mas afligiu-se quando os viu a dirigiram-se para um dos cantos do estabelecimento onde estavam, meio escondidos, os seus 13 empregados. Percebia-se que estavam assustados. Pudera, eram todos cristãos. Farida, sem pensar nas consequências, enfrentou os terroristas e disse-lhes, com a voz mais determinada que lhe foi possível: “Têm que me matar primeiro, antes de tocarem neles”. Falou-lhes no dialecto local, o Maranao. Os terroristas, todos muito jovens, compreenderam que ela estava mesmo determinada e deixaram a loja com os bolsos cheios de coisas roubadas mas sem terem derramado sangue, sem terem disparado uma única vez as suas metralhadoras. Porém, foi por pouco. Depois de os terroristas terem deixado a loja, Farida contactou com um familiar para ajudar os seus empregados a apanharem um barco para atravessarem o lago Maranao, rumo à cidade Iligan, onde estariam a salvo.
Histórias de heróis
Não foi só Farida que mostrou coragem e compaixão nestes dias de tumulto em Marawi. Mais histórias de solidariedade vão começando a surgir na Imprensa. O próprio Bispo Edwin de la Peña contou à Fundação AIS como um alto dirigente muçulmano local deu indicações precisas ao seu motorista e à sua família sobre o que deveriam dizer caso alguma vez fossem interpelados pelos terroristas. Depois, ele próprio os acompanhou até ao autocarro que os transportou também para a cidade de Iligan. “Considero-o um herói”, disse D. Edwin. “Considero-o um herói por se ter ocupado pessoalmente de um grupo de cristãos que procuravam fugir do perigo.” A cidade de Marawi transformou-se num lugar fantasma. As casas estão destruídas e não se vê vivalma. Porém, todos sabem que centenas de jihadistas estão entrincheirados e continuam decididos a lutar até ao fim. Este ataque veio demonstrar que a solidariedade também existe e é possível muçulmanos e cristãos viverem lado a lado em paz e sem ódio. Essa é outra guerra. É uma guerra que se trava sem armas e sem vingança. Por estes dias, ressoam ainda as palavras que o Santo Padre proferiu recentemente no Egipto: “O único fanatismo permitido por Deus é o da caridade.”