Dez anos de sofrimento
São cerca de 300 famílias cristãs. As aldeias de Knayeh e de Yacoubieh, na província de Idlib, ainda estão debaixo de controlo de grupos jihadistas. Por lá, continua a vigorar o temível califado. A ‘sharia’ é a lei, as mulheres têm de usar véu, as propriedades foram confiscadas, os símbolos cristãos, como as cruzes, foram derrubados. Nestas aldeias, dois frades franciscanos continuam a sua missão, apesar de todos os riscos. São sinal de esperança no meio da escuridão.
A província de Idlib, no nordeste da Síria, adjacente à Turquia, continua a ser uma região controlada por grupos jihadistas. No resto do país, praticamente a guerra chegou ao fim. Mas ali não. Em Idlib, persiste o poder dos homens de negro. Um poder baseado no terror, violência e morte. Nesta região quase esquecida, vivem ainda cerca de 300 famílias cristãs. Nas aldeias de Knayeh e de Yacoubieh já não se escutam mais os sinos a convocar o povo para a missa, nem se vêm as cruzes que simbolizam a presença dos cristãos. Mas, apesar de toda essa violência, ainda se reza o ‘pai-nosso’ nestas terras controladas pelos jihadistas. Em toda esta região, há apenas dois padres. São dois franciscanos. Os frades Luai Bsharat, 40 anos, e Hanna Jallouf, de 67, poderiam ter já abandonado a província de Idlib, mas decidiram ficar. Por ali vivem ainda cerca de 300 famílias cristãs, seguramente que mais de mil pessoas. “O seu sofrimento começou há uma década.” O frade Firas Lutfi, o franciscano responsável pela Síria, Líbano e Jordânia, conta à Fundação AIS que estes cristãos não sabem o que é viver em liberdade desde que a guerra teve início em 2011. “Grupos militantes tomaram o controlo da região e proclamaram-na um Estado Islâmico, confiscando as propriedades dos cristãos, impondo a ‘sharia’ islâmica a todos os não-muçulmanos, anulando o direito de se movimentarem livremente nas suas próprias aldeias, forçando as mulheres a usar o véu, destruindo quaisquer símbolos cristãos que estivessem à vista…”
Violência e morte
A razia foi total. As cruzes das igrejas e dos cemitérios foram decepadas como símbolo da subjugação de um povo. Ao longo destes anos de sofrimento, foram inúmeros os casos de violência, tortura e morte que os cristãos tiveram de suportar face à impiedade dos jihadistas. “Foram muitas as vezes que estes extremistas perseguiram, atacaram e espancaram, sequestraram, torturaram e até mataram alguns dos nossos irmãos e irmãs.” O padre Firas – que já esteve em Portugal – recorda o caso dramático do padre François Murad, “decapitado em 2013”, e, mais recentemente, o de “uma professora que foi violada e morta em Yacoubieh”. A violência nunca deixou de fazer parte do dia-a-dia destes cristãos encurralados numa província sitiada, onde o ‘califado’ continua a ditar as leis baseadas no horror e na morte. Diz o Padre Firas Lutfi que estes cristãos “mantém escondidas a sua fé e modo de pensar”. Na província de Idlib, nas aldeias de Knayeh e de Yacoubieh, a vida é dura. Além da violência, há ainda a o drama da própria sobrevivência. “A presença dos Franciscanos é um sinal de esperança no meio da escuridão e do desespero”, sintetiza o padre Firas, no testemunho enviado para a Fundação AIS em Lisboa. “Por isso, eles necessitam de todo o apoio que possam obter, especialmente de apoio financeiro, porque os locais não podem colher as suas colheitas, confiscadas, ou vender os seus próprios produtos… a única forma é a ajuda humanitária...” O futuro em Idlib, na Síria, continua ensombrado pela guerra, violência e perseguição. Mas ali, naquelas aldeias, dois frades franciscanos persistem com a sua missão apesar de todos os riscos, apesar de todo o sofrimento. São, por isso, sinal de esperança. Uma esperança que precisa de ser alimentada com a nossa solidariedade.