AIS: Uma Igreja de mártires
A situação já era grave mas piorou em 2019. Desde então, a ameaça jihadista tem levado cada vez mais pessoas a abandonar as suas casas, fugindo do terror. Há muitas aldeias sem ninguém. O fantasma do medo, da violência dos grupos armados, está a atingir a comunidade cristã. A realidade é brutal: Igrejas fechadas, paróquias vazias. Do Burquina Fasso chegam-nos pedidos de ajuda…
“Existem terroristas que, com armas na mão, pretendem forçar todo o continente africano a tornar-se islâmico.” O Padre Pierre Claver, que acompanhou uma equipa da Fundação AIS ao Burquina Fasso no início do ano passado, descrevia assim a situação da comunidade cristã no norte do país: “Querem introduzir a lei da ‘sharia’. Mas existem também outros que estão a usar o Islão como pretexto para promover os seus interesses financeiros ou criminosos”. Perante esta ameaça, as populações não escondem um sentimento de orfandade. As autoridades revelam-se impotentes para se oporem aos terroristas e isso agrava a tragédia que se vive nesta região de África, quase despercebida aos olhos do mundo. A situação é tão grave que os próprios sacerdotes muitas vezes escondem-se no anonimato para preservarem a sua segurança quando falam da violência dos grupos jihadistas, da ameaça aos cristãos. “Das 75 aldeias da minha paróquia, apenas 10 ainda são habitadas. Todas as pessoas foram embora. Como as aldeias foram abandonadas, grande parte do território está agora nas mãos de terroristas”, denunciava há alguns meses à Fundação AIS um sacerdote da Diocese de Kaya. Também ele teve de fugir com a comunidade cristã devido às ameaças contra a sua paróquia.
Um milhão de deslocados
Calcula-se que cerca de 1 milhão de pessoas estão deslocadas internamente no Burquina Fasso por causa do terrorismo. Desde 2019, mais de mil pessoas foram mortas. Mais de uma dezena de padres, sete congregações religiosas e cerca de duas centenas de coordenadores pastorais tiveram que abandonar os locais onde se encontravam em missão por questões de segurança. Perante esta realidade, durante a visita ao país em Fevereiro de 2020, a Fundação AIS perguntou ao Padre Pierre Claver Belemsigri como via o futuro imediato para o Burquina Fasso. A sua resposta é um grito contra a violência e o medo. “É preciso haver um despertar nacional e uma resistência popular. As armas por si só não são suficientes. Lamentavelmente, o mundo não parece ter entendido que o nosso país corre o risco de desaparecer se não nos unirmos contra os terroristas, em oração e solidariedade.”
Espalhar o terror
O Padre Boniface Ouedraogo, ecónomo da Diocese de Ouahigouya, fala num ambiente de enorme insegurança. “Tanto líderes das comunidades cristãs, bem como familiares de padres ou de pessoas consagradas, são alvo de raptos e assassínios com o objectivo de se espalhar o terror e de converter à força as populações para o islão radical”. A situação dos cristãos “é extremamente preocupante” no Burquina Fasso assim como em quase toda a região do Sahel, confirma também Rafael D’Aqui. Segundo este responsável pelos projectos em África da Fundação AIS, está a assistir-se a uma mudança estratégica por parte dos grupos jihadistas, que “mudaram para o Sahel” o plano para a instalação de um Califado Islâmico. “E o seu objetivo – afirma D’Aqui – é eliminar todos os vestígios do Ocidente, isto é, educação, liberdade religiosa, e assim por diante…” O Burquina Fasso é apenas um dos países que constituem o chamado Sahel, uma faixa de território que vai da Mauritânia até à Eritreia. Para Rafael D’Aqui, o ano de 2019 veio confirmar os piores presságios. “Durante o ano de 2019, a Igreja no Burquina Fasso foi abalada por terríveis ataques terroristas, transformando-se numa verdadeira ‘Igreja de mártires’”, diz o responsável da Fundação AIS. E o mundo parece ignorar o que se passa nesta região de África.