Zambujal 360: está a nascer uma nova rota dos ODS

Notícias 20 junho 2024  •  Tempo de Leitura: 11

É um projeto inovador e ousado que pretende tornar o Bairro do Zambujal, situado no concelho da Amadora, no primeiro bairro social do mundo embaixador dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas.  

 

Graças ao trabalho e dedicação da ONGD Ad Gentes e da associação CAZAmbujal, ao longo dos últimos meses, este bairro com cerca de 4.000 habitantes tem assistido à criação de uma galeria de arte urbana sobre os 17 ODS que pretende atuar como agente de mudança social e promover a sustentabilidade. 

 

17 artistas com diferentes inspirações e técnicas têm vindo a trabalhar para que até ao final do ano a galeria de arte urbana fique completa, criando uma nova rota ODS para atrair visitantes, turistas e estudantes ao bairro.  

 

O projeto Zambujal 360 vai apostar na formação de jovens, no estabelecimento de uma rede de comerciantes, na requalificação de espaços urbanos, assim como na promoção artística, social e cultural junto da comunidade. 

 

Já é possível visitar este projeto que conta com o apoio institucional do Centro Regional de Informação das Nações Unidas para a Europa Ocidental (UNRIC) e que é financiado por 17 entidades, entre fundações, municípios e empresas do setor privado.  

 

A ONU Portugal visitou o bairro e falou com Mário Linhares, um dos impulsionadores Zambujal 360. 

 

ONU Portugal: Como nasceu a ideia do Zambujal 360?  

 

Mário Linhares: Nasce de muitos anos a fazer voluntariado e também de escutar as preocupações que a comunidade do bairro do Zambujal tem. Havia a ideia de pintar uma escadaria, de promover o comércio do bairro e as coisas positivas que aqui existem. A comunidade não conhecia os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e vimos que eles poderiam ser o tema unificador para potenciar muito daquilo que as pessoas já fazem e/ou sonham fazer. De repente, deram-se conta que os projetos locais relacionam-se mesmo com os temas globais. 

 

Conclusão, começou-se por escutar e dar algum sal àquilo que as pessoas já estavam e queriam fazer. Houve depois uma fase em que foi preciso garantir apoios, naturalmente, e a partir daí, uma vez assegurado o financiamento, avançou-se. 

 


Mário Linhares é um dos impulsionadores do projeto Zambujal 360.

 

ONU Portugal: Como é que foi todo esse processo?  

Mário Linhares: Obter financiamento foi um processo difícil. Tínhamos concorrido antes a algumas linhas de financiamento com outros projetos e, além de complexo, é sempre bastante difícil ser selecionado, o que torna tudo frustrante. Com o Zambujal 360, estávamos convictos que o projeto tinha de acontecer independentemente de alguém nos dizer que não, pelo que concorrer a fundos ficou fora da equação. 

 

Começámos por consolidar o conceito e quantificar as despesas. Dividimos o orçamento em 17 partes e fomos à procura de 17 entidades que fossem o matchperfeito para cada ODS e, assim, garantir o financiamento necessário. Batemos a muitas portas, muitas não se abriram, mas aos poucos fomos começando a receber repostas positivas que nos motivaram e que também ajudaram mais parceiros a acreditar no nosso trabalho. Foi uma temporada longa de reuniões e apresentações, mas os nãos recebidos também nos ajudaram a melhorar a nossa comunicação e conteúdo até conseguirmos todo o financiamento.

 


Mural que ilustra o ODS 1 – Erradicar a Pobreza – da autoria do artista Jorge Charrua.

 

ONU Portugal: Já há 10 murais concluídos. Na maioria inclui-se a comunidade na obra artística. Pode dar alguns exemplos de como é que isto foi feito?  

Mário Linhares: No ODS 1 – Erradicar a Pobreza, por exemplo, queríamos muito partir de histórias reais de pessoas que deram a volta por cima em relação à pobreza. A pintura que temos conta a história de duas irmãs improváveis que cresceram juntas. Isto porque uma delas foi adotada por uma família do bairro. Sendo uma branca e a outra cabo-verdiana, é uma história muito forte, pois também é um sinal de como o racismo não faz sentido. Por ter passado a pertencer a uma família alargada, teve acesso a condições e oportunidades que não teria tido apenas com a sua família biológica. É uma história muito inspiradora.  

 

Na verdade, o bairro está repleto de histórias de famílias e pessoas que deram a volta por cima, o que é incrível de ver, porque às vezes é preciso estar em contextos destes para nos darmos conta que a superação é sempre possível, mesmo em situações difíceis. Quando não se consegue sozinho, a comunidade em que estamos inseridos pode e deve ajudar. 

 

Mas este projeto não é só artístico. Pretende-se que seja apenas o ponto de partida para iniciativas que tenham impacto social no bairro. 

Mural que ilustra o ODS 5 – Igualdade de Género – da autoria de Mariana Duarte Santos.

Veja o processo de criação do mural sobre o ODS 5 – Igualdade de Género

 

ONU Portugal: Pode explicar um pouco melhor de como isso será feito? 

Mário Linhares: Quando alguém ouve falar do Zambujal 360, pode pensar que é apenas mais um projeto de arte urbana, mas quando nos visita, percebe que a nossa galeria de arte urbana sobre os ODS é um meio para muito mais. Por exemplo, no ODS 5 – Igualdade de Género, está representado com um jogo de xadrez, um jogo intelectual onde homens e mulheres competem em igualdade de circunstância, independentemente da sua força muscular. 

 

Queremos chamar associações de xadrez a virem ao bairro e incentivar crianças a jogar xadrez. Além disso, este mural tem muitos livros de diferentes autores que abordam o tema da igualdade de género de forma direta ou indireta e queremos também começar a promover sessões de leitura, de debate, para que as pessoas fiquem inquietas e com vontade de ler algum destes autores. 

 

A ideia principal é que cada pintura e respetivo ODS sejam uma espécie de fósforo que inicie e ilumine alguma transformação. Pode ser mais pessoal e interior ou de comunidade, mas nós sentimos que estamos a criar as condições para que algo possa nascer.  

 

Adicionalmente, há também parceiros que querem contribuir além do que imaginámos. A EDP, por exemplo, quer implementar os bairros solares, instalando painéis de energia renovável para tornar os edifícios mais eficientes ao nível energético, trazendo o seu know-how relativo ao ODS 7. A Imprensa Nacional Casa da Moeda quer editar um livro com todas as histórias das pinturas. A FLAD promove o projeto aos universitários norte-americanos que estão a estudar em Portugal. A Fundação Altice apoia-nos também na área tecnológica e de comunicações. A Vieira de Almeida dá-nos apoio jurídico. E estes são apenas alguns exemplos de como as parcerias podem ser sempre mais do que o esboço inicial. 


A artista Lígia Fernandes inspirou-se nas hortas do bairro para realizar o mural sobre o ODS 2 – Erradicar a Fome.

 

ONU Portugal: Quando é que é expectável que todos os murais estejam concluídos? Porque a ideia é ter uma rota ODS que atraia turistas, visitantes e que traga mais pessoas ao bairro… 

Mário Linhares:  Decidi perguntar ao Chat-GPT onde se deve ir para conhecer melhor os ODS. A resposta que aparece em 1.º lugar indica a sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, mas as restantes não são locais especializados no tema.  

 

Em Portugal, o bairro do Zambujal já é o local a visitar para conhecer melhor os 17 ODS. São bem vindos os professores e alunos de qualquer ciclo ou grau académico, mas também empresas, associações, familiares ou turistas. Para nos visitarem é necessário comprar um bilhete para uma visita guiada, que permite conhecer a história do bairro, das pinturas e sua relação com os ODS.  

 

A formação que estamos a dar aos jovens irá permitir-lhes serem embaixadores ODS e, por ser uma visita guiada paga, cada jovem será remunerado pelo seu serviço. É este o nosso modelo de sustentabilidade, além de garantir a autonomia económica do projeto, possibilita trabalho digno para os jovens. 

 

Mas não fugindo à pergunta, esperamos ter a galeria de arte urbana ODS pronta até final de 2024. Um dos murais será em cerâmica! Honraremos assim a longa tradição histórica que Portugal tem na arte urbana através da modelação em barro e da azulejaria. 

 

Em Portugal, um lugar que não estava no mapa, passará a ser motivo de interesse e de debate: o bairro do Zambujal, o primeiro bairro social embaixador dos 17 ODS. 

 

Saiba mais sobre o Zambujal 360.

 

[@Fonte]

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