A surpresa da festa
DOMINGO IV DA QUARESMA Ano C
“Tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos,
porque este teu irmão estava morto e voltou à vida,
estava perdido e foi reencontrado.”
Lc 15, 32
Se me perguntassem qual é, para mim, a parábola mais bela contada por Jesus, creio que não hesitava e diria: “a do pai e dos dois filhos, contada por S. Lucas”! No coração da Quaresma deste ano, no domingo “laetare”, da alegria, em que os sorrisos afloram aos rostos, habitualmente sisudos, dos fiéis, quando vêm o padre entrar com paramentos cor-de-rosa, entramos nela de corpo inteiro. Porque nela estamos todos nós e está a nossa história, já e ainda a caminho da festa que o Pai nos oferece.
Há um ambiente de tragédia que a percorre. Um pai que deseja a comunhão com os filhos e não consegue. Começa por ser tratado como se tivesse morrido pelo mais novo que pede a sua parte da herança e abandona a casa. Não desiste de esperar o seu regresso, e tem de travar o coração para não o ir buscar à força. Descobre que o outro filho tudo cumpria mas com pouco amor e não é capaz de aceitar o regresso do irmão. É a descrição da realidade do nosso mundo: todos chamados a viver uma mesma felicidade, mas divididos e em guerras por ganâncias e egoísmos, incapazes de nos acolhermos como irmãos.
O pai é aquele que está sempre em movimento: faz a vontade ao filho mais novo, o coração segue os passos atribulados do filho, corre ao seu encontro quando o vê vir ao longe, manda revesti-lo com as vestes de filho, dá ordens para que a festa comece, vem ouvir e falar ao coração do filho mais velho, para que entre na festa. É um pai que ouve e só fala para dizer a alegria da passagem da morte à vida dos seus filhos. Dos dois, pois o segundo, se se não entrar na festa ficará na morte.
Jesus contou esta parábola aos “filhos mais velhos”, os escribas e fariseus, (talvez sejamos nós!), que murmuravam por Jesus acolher os pecadores, os “filhos mais novos” (quantas vezes nós e tantos outros!). Os filhos parecem comportar-se como assalariados e olham o pai como patrão: assim pede para ser tratado o mais novo, consciente do mal que fez; e assim descreve o mais velho o seu trabalho na casa do pai. Mas não se cansa o pai de os tratar como filhos e de lembrar que são irmãos. Curiosamente, ambos falam ao pai, mas nunca falam entre si! Seremos parecidos com eles, anos pós anos a rezar ao mesmo Pai, lado a lado, sem nos conhecermos, sem “termos nada a ver uns com os outros”?
Ficamos sem saber se o irmão mais velho entrou na festa. Porque cabe a cada um de nós responder. Ainda mais, uma festa em dia de trabalho, na surpresa e na abundância de um Pai que tudo gasta por amor dos filhos. Onde não contam os méritos nem se apontam os deméritos de ninguém. O que vale é o “vitelo gordo” da surpresa do amor do Pai, oferecido a quem se alegra por ser filho e irmão. Que pena não serem os cristãos conhecidos pelos “da Festa”, como já fomos conhecidos pelos “do Caminho”!