Da noite ao dia
DOMINGO I DO ADVENTO Ano B
“Vigiai, portanto, visto que não sabeis
quando virá o dono da casa:
se à tarde, se à meia-noite,
se ao cantar do galo, se de manhãzinha.”
Mc 13, 35
Conta-se que um mestre perguntou um dia aos seus discípulos: “Quem me sabe dizer o momento exacto em que termina a noite e começa o dia? “Disse um deles: “É quando, ao longe, consigo distinguir entre um cão e uma ovelha!” “Não”, respondeu o mestre. “É quando consigo distinguir uma laranjeira de uma macieira!”, arriscou outro e obteve a mesma resposta. Tentou um terceiro: “É quando consigo distinguir um boi de um burro!”, e o Mestre voltou a responder: “Não”. Como mais nenhum avançava outra hipótese, o Metre concluiu: “Termina a noite e começa o dia quando, ao olhar o rosto de alguém, consigo reconhecer nele um irmão.”
Entramos no Advento e num novo ano litúrgico com um quádruplo imperativo: “Vigiai”!. E como gostamos muito de saber tudo, prever tudo, apressar tudo, temos dificuldade em lidar com a espera, que toda a vigilância supõe. Tanto mais que sabemos quem esperamos: Aquele que já veio, que está (e vem), e que virá. Não é uma espera passiva ou amedrontada aquela para a qual o Advento nos convoca. Não estamos perdidos nem desesperados, mas, com o entusiasmo da namorada que o namorado convidou para ir a um baile, é uma espera ocupada em prepararmo-nos, alindarmo-nos e perfumarmo-nos, enquanto nasce e cresce em nós o desejo do encontro. E antes de esperarmos assim por Jesus, já Deus espera sempre por nós. Como no filme “A minha namorada tem amnésia” com Adam Sandler e Drew Barrymore, também Deus tudo faz para que O reconheçamos e acolhamos em cada manhã.
Da noite ao dia é assim que os nossos irmãos judeus contam as horas. Os rabinos judeus falam das quatro noites em que Deus entrou na história humana: a da Criação (ao criar a Luz); a da Aliança com Abraão; a da libertação de Israel do Egipto na noite de Páscoa; e a futura em que Deus libertará a humanidade de todo o mal. Esta última é, para nós, cristãos, a da Páscoa de Jesus, verdadeira libertação da morte e dom de salvação para todos. Assim as grandes festas cristãs da Páscoa e do Natal celebram-se da noite para o dia, e se vivemos neste ano uma imensa noite que é também esta pandemia, vigiamos e caminhamos para a luz de um dia novo. E para quem custa ainda a esperança da vida eterna, recordo o diálogo entre Charlie Brown e Snoopy voltados para o pôr do sol: “Um dia nós vamos morrer, Snoopy!”. “Sim, mas todos os outros dias vamos viver!”, responde Snoopy.
Vigiar é amar e esperar. No meio da escuridão que também se abate sobre nós, em que os sofredores têm rosto e nome, todos podemos ajudar Jesus a nascer pois Ele é o dia que esperamos. Podemos ler na mensagem deste Advento dos Bispos de Portugal: “O Deus do Advento vem para o meio desta pandemia, pega na nossa mão, muda o nosso coração e envia-nos a mudar a situação.” E o dia amanhecerá!