Quem escutamos?
DOMINGO IV DA PÁSCOA Ano C
“As minhas ovelhas escutam a minha voz”
Jo 10, 27
Quem nunca ouviu dizer que “uma imagem vale mais do que mil palavras”? E quem é capaz de resistir ao constante apelo das imagens com que os incontáveis écrans prendem a nossa atenção? Ouvir e escutar parecem ser desvalorizados pela embriaguez da visão. E são tão importantes! Antes de ver, ainda no seio das nossas mães, dizem os pediatras, que começamos por ouvir. É pelo silêncio e pelos barulhos, pelas palavras e pela música que primeiro contactamos com a vida. Dizem mesmo que começamos aí a reconhecer as vozes da mãe e dos mais próximos.
Pela escuta aprendemos e surpreendemo-nos, maravilhamo-nos e ouvimos também o que não gostamos, criamos o diálogo que é dádiva e recebimento, abrimo-nos ao que é novo e desconhecido. Não é fácil escutar quando também temos tantas coisas para dizer, mas bebemos as palavras de quem amamos. A escuta implica abrir um espaço para acolher o outro nas suas palavras, à vida nos seus ruídos e melodias. Das histórias que alguém nos lia em pequeninos, aos conselhos que nem sempre nos agradavam, fomos escolhendo vozes e mensagens importantes, para o diálogo que faz crescer.
No coração dos ruídos do mundo, Jesus ressuscitado faz ecoar a sua voz. Apresentando-se como bom e verdadeiro pastor que ama e guia as suas ovelhas, propõe uma relação de amizade e confiança, e as suas palavras iluminam e comprometem. Ao contrário de muitas vozes que manipulam e aprisionam, Jesus oferece palavras que abrem horizontes e libertam. Convida a rever as ideias falsas de Deus e os preceitos religiosos que afastam do seu amor. Revoluciona as relações humanas com a ousada proposta do perdão e da reconciliação. Denuncia o perigo das riquezas e da ganância, e propõe a alegria do serviço e da partilha. Revela Deus como Pai e faz de todos irmãos pela sua morte e ressurreição. Apresenta o amor até ao fim como critério fundamental de vida.
Deus começou por nos chamar e em cada dia chama-nos de novo. Chamou primeiro a vivermos e a cuidar da vida com amor. Chamou-nos em Jesus a viver como seus filhos. E chama-nos a dar a vida como Ele. Nos muitos modos, caminhos, serviços e carismas em favor dos irmãos e do mundo. E onde ou quando O podemos escutar? Em todo o tempo, nas muitas surpresas de cada dia, no silêncio e no barulho, mas especialmente quando escutamos os outros. Não foi o primeiro convite que o Sínodo dos Bispos 2023 fez a toda a Igreja? “A escuta é o primeiro passo, mas requer que a mente e o coração estejam abertos, sem preconceitos. […] Que espaço ocupa a voz das minorias, dos descartados e dos excluídos? Conseguimos identificar preconceitos e estereótipos que impedem a nossa escuta? Como ouvimos o contexto social e cultural em que vivemos?” Se deixamos de escutar Jesus, quem passamos a escutar?