Escolher é fundamental
DOMINGO I QUARESMA Ano A
“«Se és Filho de Deus,
diz a estas pedras que se transformem em pães.»”
Mt 4, 3
A vida humana é a tapeçaria das nossas escolhas. E se são muitos os fios e as cores disponíveis, nos momentos cruciais parece que nos encontramos, quase sempre, diante de duas possibilidades. Os famosos “dois caminhos” de que tantas vezes fala a Escritura! Se muitas vezes é claro o caminho que vamos escolher, porque o bem e o mal nos aparecem com evidência, a maior parte das decisões é tomada na confiança de escolher o que parece melhor.
Ao iniciarmos de novo a Quaresma somos confrontados com as escolhas de Adão e Eva e com as escolhas de Jesus. Não reconhecemos nelas as que, de tantas maneiras, também são as nossas? Em ambas uma promessa “fácil”, uma “tentação”, um “mal” pintado com cores bonitas e atraentes. A resposta é substancialmente diferente: os nossos “primeiros pais” escolhem o que é fácil; Jesus escolhe alicerçado na Palavra de Deus. O lugar também é diferente: os primeiros estão num jardim apetecível, onde nada falta; Jesus caminha pelo deserto. Aos primeiros parece nada saciar, Jesus tudo relativiza ainda que a sua identidade esteja em jogo: “Se és Filho de Deus...”. Sente-se que Adão e Eva estão à procura de si mesmos, Jesus revela-se na escolha de fidelidade a Deus.
No fundo, todos estamos presentes no jardim e no deserto. Estamos diante das imensas possibilidades que a liberdade nos concede. Esse dom tão precioso e tão maltratado. Tão confundido por ideologias e atropelado por “paternalismos”. Esse dom que está intimamente ligado à obediência. Obediência à identidade humana e ao projecto de Deus. A obediência que nasce na confiança. Porque ter confiança de que Deus quer o melhor para o homem, só é possível quando nos descobrimos amados por Ele.
As escolhas mostram também os nossos limites. Convidam-nos à humildade de aprender, à alegria da partilha, à comunhão do caminho. Convidam-nos a escutar esta voz que fala mais fundo, a voz de Deus que vem quando menos se espera. Apontam para a fragilidade de que estamos revestidos e para a fraternidade que é urgente restabelecer. Da tentação de adiar, que o músico António Variações bem cantava, “É p’rá amanhã, bem podias fazer hoje […] É p’rá amanhã, bem podias viver hoje…”, propôs-nos o bom Papa S. João XXIII: “… fugirei de dois males: a pressa e a indecisão.” E acreditando que Deus até “escreve por linhas tortas”, nas escolhas que fazemos, a confiança fundamental é esta: Deus nunca nos abandonará!