Diário da JMJ 6 – A minha primeira Via-Sacra
Não gosto da Via Sacra, confesso. Gosto da procissão dos Passos da minha paróquia, gosto muito da liturgia de Sexta-feira da Paixão, único dia do ano em que não há missa, mas a Via-Sacra, que lembra em 14 estações os passos de Jesus entre ser preso e ser sepultado, é uma das devoções católicas que não me move. Acredito que não será por isso que irei parar ao inferno ou ao Purgatório. Já conheci um padre que não embirrava com a Procissão do Corpo de Deus e outro que não gostava de rezar o terço e fazia por ignorar cada vez que calhava o Livro dos Macabeus ser lido na missa.
A Igreja, una na diversidade, também permite isto: é vã a fé que não professa a morte e ressurreição de Cristo, como diz S. Paulo, mas cada um pode ter mais sensibilidade a determinadas formas de devoção do que a outras, gostar mais de uns santos do que de outros e até não acreditar em fenómenos como as aparições de Nossa Senhora aos Pastorinhos, em Fátima. E, já agora, falando em Fátima, onde este sábado vai estar o Papa, também não consigo rezar o terço internacional na capelinha: fico desvanecida a ouvir as sonoridades das várias línguas e não rezo nada de jeito.
Bem, voltando à celebração que marcou este quarto dia de Jornada Mundial da Juventude (JMJ) de Lisboa, esta sexta-feira foi a primeira vez que estive presencialmente numa Via-Sacra da JMJ. Em Paris-97, sei que na sexta-feira foi dia de jantar na família de acolhimento e lembro-me de ter havido uma Festa dos Povos na paróquia onde estávamos, mas já não tenho certeza do dia; em Roma-2000 terá havido uma Via-Sacra no Coliseu, mas não me lembro, só sei que lá não estive; de Colónia-2005 não faço ideia e em Madrid-2011 sei bem que houve uma Via-Sacra com magníficos andores e imagens da Semana Santa espanhola, mas fui com o meu grupo rezar sozinhos à porta da igreja da paróquia onde estávamos.
Este ano, a Via-Sacra da JMJ começou para mim na conferência de imprensa da véspera quando o padre João Goulão, que coordenou a equipa que a preparou, disse que “a via-sacra é o exercício da nossa fé em que olhamos para o fracasso de outra maneira”. De facto, é uma forma de oração que termina com a morte de Deus. Como podemos acreditar que é Deus um homem que é preso e crucificado? Como lhe prestamos louvor com uma oração em que ele acaba no sepulcro? Só acreditando que o fracasso não tem a última palavra, que depois da morte há a ressurreição.
Foi o que fizeram os jovens que deram testemunho sobre os seus problemas e feridas nesta Via-Sacra. “É difícil reconhecermos a nossa fragilidade, pedir ajuda e mostrar que não somos autossuficientes”, disse João, um português que sentiu a sua saúde mental afetada pela pandemia de Covid-29.