Servir é a arte suprema!
Ficaram em silêncio porque, no caminho, tinham discutido uns com os outros sobre qual deles era o maior. Sentando-se, chamou os Doze e disse-lhes: «Se alguém quiser ser o primeiro, há-de ser o último de todos e o servo de todos.» Mc 9, 34-35
Repara nos girassóis: curvam-se perante o sol, mas se vires algum demasiado inclinado significa que está morto. Tu estás a servir, mas não és um servo. Servir é a arte suprema. Deus é o primeiro servidor, Ele serve os homens, mas não é servo dos homens.
Este pequeno diálogo entre Guido Orefice e o tio Eliseo Orefice, retirado do filme “a vida é bela”, de Roberto Benigni, é um excelente ponto de partida para a reflexão sobre o tema retirado das notícias desta semana: o Poder!
Foi tema recorrente nas capas da imprensa e nos diversos serviços noticiosos: as eleições, seja porque aconteceram em França, seja porque estão para acontecer na Europa, entre outras.
O desinteresse generalizado na política, expresso nas altas percentagens da abstenção, está inegavelmente enraizado no descrédito em quem exerce cargos de poder. A ideia de que determinados cargos são exercidos em proveito próprio é recorrente e não é recente.
Terminologicamente, penso que deveríamos começar por substituir a expressão “exercício da autoridade” por “serviço da autoridade”. Já etimologicamente, relembro apenas que a palavra ministro deriva do latim “minister”, de minus, menor, e usava-se para designar alguém subordinado a outra pessoa, “magister”, de magis, mestre, maior. Qualquer semelhança com a atualidade é certamente pura coincidência.
Mas o natural fascínio pelo poder, quase instintivo, não é exclusivo da classe política, pese a sua maior responsabilidade. Até os discípulos, enquanto Jesus falava do maior ato de serviço que estava para acontecer, discutiam, no extremo oposto, quem seria o mais importante. Faz parte da natureza humana, ninguém nasce imune e revela-se nas mais diversas idades e contextos ao longo da vida.
Na esfera política, todos sabemos, o poder corrompe e vicia, desde dos mais altos cargos à mais pequena junta de freguesia. E o silêncio acerca do assunto, ou o reconhecimento de alguém como o “esperto”, revela que, no fundo, até parece que há uma certa legitimidade em exercer certas influências na esperança de que um dia... Quem sabe!
Mas o poder e os interesses instalados estão também na base das relações profissionais, onde em nome de maior poder, já não se usa a “palavra de honra” e se passaram a dirimir contratos baseados em interesses frequentemente obscuros.
E que dizer da busca e afirmação de poder na interrelação pessoal, seja amizade ou amor... é causa frequente de brigas e conflitos. Basta pensar um pouco na luta de poder que exercemos na defesa da nossa opinião quando deixamos de conseguir relativizar as coisas e absolutizamos o momento, a ideia, a razão, e esquecemos o outro... Nas palavras divertidas do Papa Francisco, dia 2 de abril, “Para fazer as pazes não é preciso chamar as nações unidas”, é necessário apenas adotar uma atitude humilde e de serviço.
Até as crianças usam o argumento de quem tem o brinquedo melhor, a consola de ultima geração, etc, para se afirmarem sobre as outras. Mas os adultos, à sua maneira, não procuram o mesmo com a exibição de certos gadgets, carros, casas, status?
E se olharmos para dentro da Igreja, que pensar dos escandalosos gastos milionários do arcebispo de Atlanta, Wilton Gregory, ou do bispo alemão de Limburgo, monsenhor Franz-Peter Tebartz-van Elst? Para o Papa, tem-lo dito repetidamente, a Igreja deve ser pobre e servir os homens, e os líderes têm a obrigação de serem os primeiros servidores. A renúncia de Bento XVI é exemplo de desprendimento para todos.
Porque servir exige uma certa violência sobre nós mesmos, sobre a nossa vontade, contrapondo o despojamento ao desejo de poder.
Servir exige treino e aprende-se.
Servir exige humildade, mas não humilhação.
Servir leva-nos a reconhecer que tudo é dom... E coloca-nos numa atitude de constante abertura e acolhimento perante a vida, as oportunidades e os outros.
Servir exige uma atitude menos calculista perante a vida, de quem pensa poder dominar o futuro, e incentiva a viver intensamente o dom do presente que nos pode sempre surpreender.
O serviço é sinal de autenticidade e o que é autêntico, tal como outros valores, é reconhecido em qualquer tempo ou lugar. Dá que pensar a popularidade de um Papa que se mostra simples, humilde, autêntico. Sinais dos tempos!
A Páscoa que se aproxima, máximo ato de amor e serviço, deverá ser a passagem, o caminho para o despojamento total, onde a cruz não é sinal de derrota, contrária a uma lógica de poder, mas símbolo de uma outra lógica de entender a realidade, a vida e as pessoas. Deverá educar-nos progressivamente para outros valores: a escolha do último lugar, a renúncia a miragens demagógicas, o acolhimento dos que não contam.
[foto ©Ben Hammerton]