O celibato numa sociedade erotizada
Na sociedade ocidental passou-se de uma sexualidade reprimida e escondida para a sua banalização e exposição. Esta transformação sucedeu sem que, em paralelo, a sociedade tenha feito qualquer investimento sério na formação para a vivência da sexualidade de adolescentes e jovens. Por isso, entre a forma como se vivia "antigamente" e algumas manifestações atuais de libertinagem, parece ter ficado por encontrar, algures, um ponto de equilíbrio.
Também por isso, a Igreja é chamada a ajudar as pessoas a encontrar uma forma boa de viver a sua sexualidade. E deve cuidar, desde logo, daqueles que, no seu seio, se sentem chamados a uma vivência da sexualidade em celibato.
No contexto de uma sociedade cada vez mais erotizada, é mais difícil viver esta opção; mas, mais difícil ainda, é acreditar que alguém seja capaz de ser fiel a essa forma de estar na vida. Por causa disso, os céticos rejubilaram ao verem num título deste jornal o reconhecimento do bispo Juan María Uriarte que "há padres com o vício da pornografia e vida dupla".
Essas constatações foram proferidas no Simpósio do Clero em Fátima na semana passada. Já a afirmação, que vem no corpo da notícia, de que a maioria dos celibatários o vivem "com elegância espiritual, impregnada de paz e alegria interior" passou ao lado dos títulos...
É natural, porque ninguém é perfeito, que até os celibatários bem resolvidos tenham os seus fracassos e quedas, mas isso não põe em questão a sua opção e a sua convicção que é esse o estado de vida que os realiza e faz felizes. Doloroso deve ser viver uma vida celibatária para quem, pelas mais variadas razões, até económicas, abraçou o sacerdócio, mas sem nunca assumir nem integrar verdadeiramente essa opção de vida. Esses terão de encontrar outras formas de descarregar, satisfazer ou sublimar essas pulsões. E muitos acabam por fazê-lo através de uma vida dupla, pela pornografia... ou pela busca do poder nas mais refinadas formas de clericalismo. O Papa Francisco tem-no denunciado.
Quando o relacionamento de um sacerdote, seja ele hétero ou homossexual, é tornado público, tende a haver maior condescendência do que quando um celibato mal integrado descamba em abuso de poder, em avareza ou na exploração do povo. E é bem que assim seja e continue a ser. Sobretudo quando tal leva à abjeção, como é o abuso de menores.
Há, contudo, outro tipo de comportamento que, podendo ter a mesma raiz, não é motivo de escândalo e chega a ser promovido: o carreirismo. Quem o pratica, pode até passar a imagem que vive o celibato como um dom. Pode aparentar desprendimento e dedicação à Igreja. Contudo, tarde ou cedo, percebe-se que não adquiriu o "cheiro das ovelhas" e que vive mais para ser servido do que para servir.
Todas estas formas desajustadas de viver e de assumir o celibato exigem um maior investimento da Igreja na formação dos futuros sacerdotes, bem como na formação permanente do clero: só quem tiver um bom crescimento humano e espiritual pode alcançar uma maior maturidade afetiva e sexual.