O eco da Páscoa
Ao celebrarmos a Páscoa, ecoa em nós uma novidade transformadora.
Uma luz que trespassa todas as teias aranhas, todos os lugares ocultos e todas as zonas cinzentas do nosso coração.
Deixemos que assim seja, sem medos. Peçamos a Graça disso mesmo. A Graça que permite que passemos pelo encontro com Jesus Ressuscitado deixando-nos tocar.
Ele sussura ao nosso ouvido que ainda que a vida tenha dor e sofrimentos, que os tem, não nos deixará sós. Nunca. Estará connosco até ao fim dos tempos. Pede-nos a mão e olhando-nos nos olhos com ternura, acrescenta: Ama. Amem-se uns aos outros como Eu vos amei, como eu vos amo.
E o Amor redefine-se neste Mistério e para sempre. Escolha, virtude, por vezes combate, outras vezes deserto, umas vezes até entrega total. Mas sempre caminho de Bem, de Vida, de Salvação.
E a Cruz não é fim mas recomeço. E a nossa Cruz não é vivida às escuras mas à luz da Ressureição. E isso faz e fará toda a diferença.
Fazendo votos de que a todos nós chegue esta luz transformadora, partilho um dos textos mais bonitos que me leram e me convidaram a ler. Que estas palavras façam ecoar em nós o apelo e o entusiasmo que é a Páscoa.
«[Este mandamento] é recapitulado, é resumido nesta palavra: ‘amarmo-nos (uns aos outros)’. Mas há mais uma coisa a dizer: que o tempo passa. E o problema fundamental da humanidade, desde há dois mil anos, permanece o mesmo: ‘amarmo-nos’. Só que agora torna-se mais urgente, muito mais urgente. E quando hoje ouvirmos repetir que nos devemos amar uns aos outros, saibamos que já não nos resta muito tempo. Temos que nos apressar. Apressemo-nos a amar. Nós amamos sempre muito pouco e muito tarde. Apressemo-nos a amar. Por que no entardecer da vida seremos julgados pelo amor. Porque não existe amor esbanjado. E porque não existe maior emoção que sentir, quando estamos apaixonados, que a nossa vida depende totalmente de uma outra pessoa. Que não nos bastamos a nós mesmos. E porque todas as coisas, mesmo as que são inanimadas, como as montanhas, o mar, as ruas... mais, mais! O céu, o vento... mais! As estrelas... mais! As cidades, os rios, as pedras, os palácios... Todas estas coisas que, em si, são vazias, indiferentes, subitamente, quando as olhamos, são carregadas de um significado humano e fascinam-nos, comovem-nos. Porquê? Porque contêm uma premonição de amor. Até as coisas inanimadas. Porque a cobertura de toda a criação é o amor. E porque o amor combina com o significado de todas as coisas: a felicidade. Sim, a felicidade! A propósito de felicidade: procurem-na. Todos os dias, continuamente. E ainda, que aquele que me ouve agora se ponha à procura da felicidade, agora, neste mesmo momento! Porque está aí, já a têm, já a temos. Porque nos foi dada a todos. Foi- nos dada, num dom, quando éramos pequenos. Foi-nos dada como presente, em dote. Era um presente de tal maneira belo que a escondemos, como fazem os cães quando escondem o osso. E muitos de nós escondemo-la tão bem que não nos lembramos onde a guardámos. Mas já a temos, já a têm! Vejam todos os lugares. Nas caixas, nos compartimentos da vossa alma. Tirem tudo cá para fora. Os caixotes e as cómodas que estão dentro. Verão que sai. Está aí a felicidade! Tentem encontrá-la. Talvez a encontrem por surpresa, mas está aí. Devemos pensar sempre na felicidade. E, ainda que ela, às vezes, se esqueça de nós, nós não nos devemos nunca esquecer dela, até ao último dia da nossa vida. E não devemos ter medo algum da morte. Reparem que é mais arriscado nascer que morrer. Não tenham medo de morrer, mas de nunca começar a viver de verdade. Saltem para dentro da existência agora, aqui. Porque, se não encontrarem nada agora, não encontrarão nada nunca mais. É aqui a eternidade! Temos que dizer ‘sim’ à vida. Temos que dizer um ‘sim’ de tal maneira pleno à vida que seja capaz de conter tudo em nós. Porque no final de tudo isto teremos percebido que não sabíamos nada e que não se compreende nada. E que só se compreende que é tudo um grande mistério e que é necessário deixá- lo estar. E que o que mais impressiona o mundo é a vida que persiste e não se percebe como. ‘Como faz?’ ‘Como faz para resistir?’ ‘Como faz para durar assim?’ É um outro mistério e nunca ninguém o percebeu, porque a vida é muito mais do que o que podemos nós compreender. Por isso resiste. Se a vida fosse só o que compreendemos nós, tinha já terminado há tanto, tanto tempo. E nós sentimos. Sentimos que de um momento para outro pode acontecer qualquer coisa de infinito. E, por agora, não nos resta senão fazer uma coisa: inclinarmo-nos».
I Dieci Comandamenti, Roberto Begnini.