Condução Pacífica
Viver o Tempo da Criação implica meditar as palavras, mas também convertê-las em acção. Quando no último COP se acordou reduzir a dependência de combustíveis fósseis, e pensando no dia mundial sem carros no próximo 22 de setembro, atingir esse objectivo é simples: carro parado não consome. Mas nem todos se podem dar a esse luxo. O que fazer?
Um dia comecei a experimentar andar de acordo com a velocidade indicada para cada via. Dentro da cidade a 50 km/h, ou por vezes a 40 km/h. Nas vias rápidas a 60, 80 ou 90 km/h, etc. Não podem imaginar o stress dos outros e quantidade de vezes que fui ultrapassado. Várias vezes observei que os apressados chegavam ao mesmo sinal vermelho que eu. A diferença é que o consumo de combustível e a quantidade de stress foi menor no meu caso. A conversão da condução agressiva à condução pacífica representa um passo transformativo na vivência do tempo da criação.
Vivemos na sociedade da pressa com a ideia de que a redução dos tempos de trajecto libertarão “tempo” para sermos mais produtivos. A história da lebre e da tartaruga nunca foi tão indicada como hoje, se quisermos ter um estilo de vida mais sustentável. Mas o curioso é que a minha experiência de condução pacífica oferece uma outra perspectiva da história: a lebre não dorme, mas depois depois da tartaruga por causa de tanto pára e arranca, mudando de trajecto quando algum aparenta ter mais tráfego. Os sinais vermelhos, o trânsito, a pessoa a querer passar na passadeira são parte das circunstâncias da vida que não estão à mercê da nossa pressa.
A condução pacífica leva-nos do ponto de partida ao ponto de chegada num tempo semelhante, mas com o coração mais tranquilo. Existem acções concretas para uma condução pacífica usando funcionalidades presentes na maior parte dos carros. Uma primeira seria usar o controlo de velocidade (cruise control) ou o limite de velocidade. Se mantiver ou limitar a velocidade à máxima possível, liberto-me da pressa e menos combustível gasto com acelerações desnecessárias e respectivas travagens.
Uma segunda acção seria tirar o pé do acelerador ao chegar a uma rotunda ou cruzamento deixando que a travagem do motor, se for a combustível, ou a inércia do carro se for eléctrico, realizar a travagem natural.
Uma terceira ação concreta que contribui para uma condução pacífica poderia ser a manutenção de uma distância de segurança entre veículos. Ao assegurar uma distância adequada do veículo da frente, reduzimos a necessidade de travagens bruscas e acelerações repentinas, o que não só proporciona maior fluidez no trânsito, como também minimiza o desgaste do veículo e aumenta a segurança. Isto também permite que o condutor reaja de forma mais serena e previsível às flutuações no trânsito, proporcionando uma viagem mais tranquila e eficiente, tanto em termos de combustível como de stress. Estas são três de muitas outras estratégias onde a condução pacífica contribui no cuidado da casa comum.
Estou ciente de que pôr estas três acções em prática não é fácil. Como acontece com qualquer viciado, também o desmame do vício da pressa na condução pode, inicialmente, causar alguma ansiedade. Andar à velocidade máxima da estrada, reduzir a velocidade atempadamente, ou manter distâncias pode não ser fácil para algumas pessoas. Porém, o sentimento de ansiedade é apenas mais uma justificação para uma pessoa se converter à condução pacífica.
A Laudato Si' do Papa Francisco é, seguramente, um convite à reflexão, mas ainda mais um convite à acção. E quando vivemos plenamente o entrelaçar de reflexão e acção, asseguramos a conversão do coração que consegue sentir o bater do coração do outro, ou do coração da Terra pelos seus ritmos, como o próprio. A condução pacífica é mais um passo nessa direcção.
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