Conto: O maior super-herói de todos os tempos
A algazarra era tanta e o barulho tão ensurdecedor que a mãe teve mesmo que ir ao quarto dos filhos ver o que se passava. Discutiam sobre quem era o maior super-herói de todos os tempos e a discussão estava bem acesa com argumentos dignos dos melhores advogados. Os dois miúdos esgrimiam considerações à volta das qualidades, poderes e atributos de variadíssimos ídolos da banda desenhada, televisão e cinema.
Enquanto que um defendia os atributos e habilidades invulgares do Super-Homem, Flash, Thor, Capitão América e Mulher Maravilha, o outro replicava com os predicados e capacidades singulares do Homem Aranha, Hulk, Batman, Homem de Ferro e Wolverine e não conseguiam chegar a acordo sobre o maior de todos em função da sua força, inteligência ou rapidez.
Então, a mãe sentou-se no meio dos dois petizes e disse-lhes que os gostos não se discutiam e que todos os super-heróis tinham, na verdade, aptidões e características extraordinárias. Contudo, referiu que não valia a pena chatearem-se por causa de personagens inventados e que pertenciam à ficção, pois nenhum daqueles que eles admiravam chegava aos calcanhares de alguém bem real, de carne e osso, que tinha vivido há pouco mais de dois mil anos e que era incomensuravelmente mais sábio e poderoso.
Os rapazinhos ficaram estupefactos com aquilo e quiseram logo saber de quem se tratava, mas a mãe preferiu dizer que se tratava de um jovem capaz de curar qualquer tipo de doença, expulsar demónios e espíritos malignos, ressuscitar pessoas mortas, além de que conhecia os pensamentos das pessoas e até sabia o futuro, caminhava sobre as águas, tinha autoridade sobre a natureza, multiplicava alimentos e possuía muitos outros poderes.
Disse-lhes que, ao contrário dos super-heróis fantasiosos, ele não tinha vindo de outro planeta, apesar de ter chegado do céu e ter passado a vida a falar de um reino que não era deste mundo. Não precisava de um disfarce para que ninguém o reconhecesse nem precisava de se esconder de ninguém. Não revelava dupla personalidade ou aparecia com outra identidade. Nunca fora exposto a nada para obter poderes especiais nem precisava de artes mágicas para ter força, poder e autoridade.
A sua superforça era diferente e não necessitava voar ou fazer ilusionismo para atrair a atenção ou convencer alguém. Não ficava alterado em função do seu humor, nem saía por aí a destruir tudo e a dar porrada aos seus adversários, pois não resolvia nada à força, com nervosismo ou raiva. Não ajudava as pessoas para se exibir nem agia por vingança. Na verdade, adorava conversar com toda a gente, mesmo com aqueles que eram mal vistos pela sociedade ou poderiam ser considerados seus inimigos. Aliás, falava muito sobre a importância de amar sem medida e até de perdoar sempre.
Os meninos estavam espantados, confusos e incrédulos com os poderes daquela pessoa de quem a mãe falava com tanta determinação, admiração e ternura e, reconhecendo que ele nem parecia ser humano, pediram-lhe que provasse o que estava a dizer para concluírem se o que a mãe dizia era verdade ou não.
Então, ela começou a desfiar alguns episódios onde o tal jovem fazia coisas extraordinárias, iniciando a sua exposição com o primeiro sinal maravilhoso da sua vida quando, estando a participar na festa de um casamento, a sua mãe se deu conta que o vinho estava quase a acabar e, a seu pedido e para surpresa generalizada, transformou água num saboroso e muito elogiado sumo da videira.
Depois, contou-lhes que, numa ocasião, uma grande multidão seguia o jovem para o escutar e, como a hora era tardia e o local deserto, ele teve compaixão de toda aquela gente e, com apenas cinco pães e dois peixes, conseguiu multiplicá-los e saciar a todos, tendo até sobejado uma grande quantidade de alimentos.
De seguida, lembrou-se de uma vez em que o jovem, depois de se ter dado conta do desânimo de uns pescadores que não tinham apanhado nada durante toda a noite, disse-lhes que lançassem as redes novamente ao mar e a verdade é que conseguiram uma incrível quantidade de peixes a ponto de romperem as redes e quase afundarem os barcos.
Os garotos estavam boquiabertos e, a seu pedido, a mãe continuou a contar que um dia o jovem foi ter com os seus amigos, que estavam num barco no mar, caminhando sobre as águas, provocando o susto e a estupefação de todos e ainda disse a um deles que fosse ter com ele da mesma maneira. Ele também caminhou nas águas e, quando começou a afundar-se, o jovem deu-lhe a mão e salvou-o.
Depois, referiu que, numa outra ocasião, em que o jovem ia de barco com os seus amigos, levantou-se uma violenta tempestade. Apesar das ondas enormes, ele dormia tranquilamente e, alertado para o perigo da situação, levantou-se e ordenou que todas as forças da natureza acalmassem e a verdade é que o vento e o mar obedeceram imediatamente.
De seguida, a mãe dos rapazes contou que o jovem chegou a dar vida a pessoas falecidas, referindo que, numa ocasião, ressuscitou um homem que já estava no sepulcro há quatro dias, dizendo-lhe que se levantasse e saísse da gruta onde havia sido depositado.
Também deu a vida ao único filho de uma viúva que o levava a sepultar. Tocando no caixão, disse-lhe que se levantasse e a verdade é que, para assombro de todos, o rapaz sentou-se e começou a falar. E ainda referiu a cena da filha do chefe religioso que, prostrando-se diante dele, pediu-lhe que impusesse as suas mãos em cima da sua filha que acabara de morrer. Ele foi a sua casa e tomando a mão da menina, ela ergueu-se para surpresa e admiração de toda a gente.
Como os rapazes estavam cada vez mais desconcertados e ansiava por mais histórias do tal jovem, a mãe decidiu contar aos filhos vários episódios, em que ela libertara várias pessoas possuídas de forças malignas. Numa ocasião, um homem lançou-se aos pés do jovem e disse-lhe que tivesse piedade do filho e que o livrasse do mal que o atormentava. Então, ele falou-lhe com firmeza e o demónio saiu do rapaz, que ficou logo curado.
Depois, lembrou-se de quando o jovem expulsou um demónio de uma pessoa muda que começou imediatamente a falar, deixando toda a multidão admirada e em alvoroço, e, ainda, do episódio de uma mulher que suplicou insistentemente por piedade e socorro porque a sua filha estava cruelmente atormentada e, ele atendeu-a pela sua grande fé, tendo ela ficado curada.
A mãe dos miúdos recordou, também, a história de um homem possesso de um espírito impuro, que veio ao encontro do jovem, saído dos túmulos e que ninguém conseguia deter nem dominar. O episódio ficara célebre pois o jovem fez com que os espíritos impuros saíssem do homem e entrassem numa grande vara de porcos e, depois se atirassem ao mar e ali se afogassem. Logo a seguir, o homem ficou curado e no seu perfeito juízo.
Uma outra ocorrência famosa que contou foi a de uma mulher possessa que um espírito tornara enferma havia dezoito anos e que andava curvada e não conseguia endireitar-se. O jovem curou-a, apesar dos inúmeros comentários depreciativos por ele fazer diversas curas num dia considerado sagrado e que, por isso, não se devia trabalhar. Mas ele tinha sempre resposta pronta, provocando a irritação de muitos.
Os rapazes estavam cada vez mais embasbacados e impressionados com o super-herói de que a mãe falava e, ainda comentavam as últimas proezas do tal super-herói, quando a mãe começou a enunciar uma quantidade colossal de curas de doenças físicas. Falou-lhes do episódio da cura de dez leprosos que pediram ajuda ao jovem e, a verdade é que ficaram todos curados, apesar de apenas um ter demonstrado gratidão e, ainda, da cena de um outro leproso que, prostrando-se por terra disse ao jovem que se ele quisesse podia curá-lo. Então, ele estendeu-lhe a mão, tocou-o e disse-lhe que sim e ficou logo curado.
Posteriormente, falou de vários casos de cegos que foram curados pelo jovem e referiu-se a um que tinha nascido sem ver e era mendigo e fora curado, após ter sido untado com lodo nos olhos e ter ido lavar-se numa piscina.
Depois, referiu-se a outro que suplicara que fosse tocado pelo jovem e, após a imposição das suas mãos sobre os olhos, começou a ver tudo perfeitamente e a distinguir tudo com nitidez. E, ainda, da cena de outros dois que gritaram ao jovem para que tivesse piedade deles e, depois de lhes ter tocado, abriram-se-lhes os olhos. O jovem só pedia que ninguém o soubesse, mas a alegria era tanta que todos divulgavam a sua fama por toda a região.
Os miúdos estavam sem palavras e bastante comovidos com o poder e bondade do tal jovem. Então, a mãe continuou a sua saga, falando de quando lhe trouxeram um surdo que também era gago e que lhe rogara que impusesse a mão sobre si. Surpreendentemente, tocando-lhe nos ouvidos e na língua com os dedos, os ouvidos abriram-se e a língua soltou-se, começando a ouvir a falar corretamente.
De seguida, a mãe dos rapazes falou da cena do paralítico que fora levado ao jovem num catre e, ele dissera-lhe que os seus pecados estavam perdoados e ordenara-lhe que se levantasse, pegasse nas suas coisas e fosse para casa. E referiu, ainda, o episódio do homem que estava paralítico há trinta e oito anos deitado junto a uma piscina pública com a esperança de um dia ficar curado. O jovem, depois de lhe perguntar se queria ficar são, disse-lhe que se levantasse, pegasse no seu catre e fosse para casa. A verdade é que começou a andar para espanto de todos.
Um outro episódio muito comentado de que falou foi o de uma mulher que sofria de uma doença havia doze anos e já correra muitos médicos e gastara muito dinheiro sem conseguir alívio algum. Por entre a multidão, decidira aproximar-se do jovem para lhe tocar nas vestes, já que acreditava que isso bastaria para ficar curada. Se assim o planeou, assim o fez e ficou logo misteriosamente sarada do seu mal. Como o jovem se dera conta da energia que de si saíra, perguntou quem lhe tinha tocado e a mulher contou toda a verdade, tendo ele ficado admirado com a sua confiança e esperança.
Posteriormente, a mãe dos miúdos lembrou-se da história de um chefe militar que tinha um empregado a morrer e pedindo ajuda ao jovem, disse que acreditava tanto nele que nem era necessário ir a sua casa, pois não se sentia digno disso e sabia que bastaria uma palavra sua para que ele ficasse restabelecido da sua saúde. E assim aconteceu. O mesmo se passou com o filho de um funcionário real que estava enfermo. Suplicou ao jovem que fosse a sua casa e o curasse pois estava a morrer e ele afirmou que ele viveria. A verdade é que quando se deslocava para casa já os seus empregados vinham ao seu encontro dando-lhe a boa notícia da cura do filho.
A mãe dos rapazes já nem sabia se já tinha contado todas as histórias que tinha ouvido falar, mas ainda se lembrou de falar-lhes da cura da sogra de um amigo do jovem, do restabelecimento da mão ressequida de uma pessoa e da recuperação da orelha de um homem que fora cortada pela espada de um amigo quando ele fora feito prisioneiro, antes de ser condenado à morte.
Quando a mãe falou em prisão e morte do jovem, os miúdos ficaram perplexos. Como era possível que alguém com tantos poderes, deixasse que o detivessem e lhe tirassem a vida? Então, a mãe disse-lhes que não lhe tinham tirado a vida. Ele tinha-a oferecido à humanidade e que o seu maior poder não eram todas aquelas coisas que lhes tinha contado antes. O seu superpoder chamava-se Amor e que não havia maior amor do que dar a própria vida para a salvação de alguém.
De seguida, a mãe disse aos filhos que o jovem acompanhava as suas palavras com aquilo que muitos chamaram de milagres, prodígios e sinais. Eles manifestavam que o Reino de que ele falava tantas vezes estava presente nele e comprovavam que ele era o Messias que as pessoas esperavam há muito tempo, além de que ajudavam a fortificar a fé naquele que faz as obras do seu pai, testemunhando que é ele era o filho de Deus.
Os garotos estavam sem palavras, enquanto a mãe continuava a argumentar, perguntando-lhes se conheciam algumsuper-herói que fosse capaz de doar sua própria vida em favor de pessoas más e pecadoras, ou se já tinham ouvido falar de alguém que tivesse morrido pregado numa cruz, mesmo tendo poder para se livrar dela, e tivesse optado por perdoar os próprios inimigos e por sofrer até à última gota como sinal de amor para redimir a humanidade inteira, cumprindo o plano de Deus que é o nosso pai comum.
E explicou-lhes que ele era rei, mas, desde o seu nascimento até à sua morte, nunca usou coroa, nunca precisou de valer-se de um exército poderoso, nem nunca se vangloriou de ser o próprio filho de Deus. Foi sempre simples, pobre e humilde, nunca discriminou ninguém e sempre olhou todas as pessoas nos olhos e com ternura. A sua proposta de salvação era, de facto, a oferta da verdadeira felicidade e da autêntica realização para toda a gente. O seu superpoder era o Amor, porque não amou só com palavras ou com alguns gestos, mas amou desmedida e gratuitamente, dando a sua própria vida.
Então, os rapazes perguntaram quem era esse super-herói que não era uma lenda, um mito, uma coisa ou uma invenção e era verdadeiramente mais poderoso do que qualquer outro herói que sempre haviam aclamado e a mãe respondeu com um brilho nos olhos que se chamava ‘Jesus’.