Neste período intenso e difícil de isolamento para todos nós, é bom redescobrir a Palavra de Deus como um fortíssimo alento e manancial de sentido. Por isso partilho a experiência e profecia de Joel.

Joel viveu numa época muito atribulada. Aproximadamente em 400 a.C. toda a região da Palestina fora atingida por duas catástrofes naturais mencionadas no seu livro: uma arrasadora praga de gafanhotos (1,4-9;2,1-11) e, como se não bastasse, seguida de uma seca prolongada que devastou as colheitas (1,10-12.16,20).

O que sucedeu a seguir foi avassalador: o povo padeceu um período de fome e miséria e não tardou a ficar abalado na sua fé. Tratava-se de algo muito sério a nível humanitário e também religioso. O livro de Joel testemunha que no templo de Jerusalém deixou de haver ofertas e libações (1,9) e nele já não prevalecia um ambiente alegre e festivo (1,12.16). A nação precipitou-se numa nuvem negra de depressão e começou a questionar a Aliança. Perguntavam onde estava Deus e o que fazia Ele diante da desgraça…

No âmago desta crise profunda e sombria, Joel converte-se num farol incandescente, ainda que possuído por uma “irritante” esperança. Sim, uma espécie de “esperança-tabu”, pois parecia troçar do sofrimento e negligenciar a atmosfera pesada. Mas, na verdade, Joel destila da sua boca o Coração de Deus que rasga o estado depressivo da nação como uma lâmina afiada e deseja extirpar a gangrena do desalento.

Sem abandonar o realismo e a seriedade que nos rodeia, vejamos o que nos diz HOJE o profeta:

1- Olhar para dentro. Joel ordenou jejum e oração, que nas circunstâncias atuais traduzem-se em paragem e recolhimento. Aproveitemos este “ficar em casa” e tempo de isolamento para treinar o olhar. Ver interiormente sem nos deixarmos descontrolar pela convulsão externa. O decisivo acontece sempre a partir do coração.

2- Recordar a fidelidade de Deus connosco e as maravilhas que realizou na nossa história. Contemos e recontemos, de coração sintonizado e orante, os episódios de vida difíceis que resultaram numa reviravolta. Percorramos esse Caminho de Salvação que Deus já percorreu «desde o princípio» (Jl 2,2) e continuará sempre a palmilhar connosco.

3- Joel desafia-nos à Conversão. Acima de tudo, a conversão ao ÂNIMO frente ao medo e à enorme provação. Estimula-nos urgentemente a alegrarmo-nos (não deprimidos ou vencidos) a partir da Misericórdia de Deus:

«Tocai a trombeta em Sião, elevai um clamor sobre o meu monte santo! (…) Convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque ele é gracioso e misericordioso, lento para a ira e RICO em MISERICÓRDIA» (Jl 2,1.13)

«Reuni o povo, purificai a assembleia, juntai os anciãos, congregai os pequeninos e os meninos de peito. Saia o esposo dos seus aposentos e a esposa do seu leito nupcial» (Jl 2,16)

«NÃO TEMAS, Ó TERRA! EXULTA e ALEGRA-TE porque o Senhor faz grandes coisas! NÃO TEMAIS, animais dos campos, porque as pastagens do deserto reverdecerão, as árvores darão o seu fruto, a figueira e a vinha produzirão abundantemente. (…) EXULTAI, filhos de Sião, ALEGRAI-VOS no Senhor, vosso Deus, porque Ele há-de mandar-vos as chuvas do Outono no devido tempo e fará cair sobre vós chuvas copiosas, as chuvas do Outono e da Primavera, como no princípio. As eiras se encherão de trigo, e os lagares transbordarão de vinho e azeite» (Jl 2, 21-24)

4- Finalmente, A certeza do futuro. Temos a Garantia do Espírito de Deus. Habitados e animados pelo Espírito Santo somos capazes de idealizar e engendrar novas soluções e tornarmo-nos protagonistas ativos de uma Nova Criação.

Ainda não sabemos como nem bem quando, mas é uma certeza da fé!

Há outro trecho de Joel cuidadosamente escolhido por Lucas como gema preciosa destinada a brilhar e refletir o grande acontecimento do Pentecostes. Mas afinal, será o Pentecostes apenas uma data a assinalar no calendário? Não, muito mais do que isso, é a confirmação da nossa esperança!

E haverá melhor retrato de esperança do que ver anciãos com a ousadia de sonhar? Anciãos que prometem futuro e jovens sábios que contemplam mais longe e mais além? Sim, creio nisto! Todos, maduros e juvenis, havemos de recriar um mundo novo.

Essa é a garantia de Joel para o nosso tempo: Visão para construir, respostas feitas de sonhos e certezas de que, apesar do presente, haveremos de trilhar vias de prosperidade e justiça:

«Depois disto, derramarei o meu espírito sobre toda a humanidade. Os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, os vossos anciãos terão sonhos e os vossos jovens terão visões. Também sobre servos e servas, naqueles dias, derramarei o meu espírito» (Jl 3,1-2)