Nesta vinha, para dar bom fruto, é preciso permanecer

Liturgia 28 abril 2018  •  Tempo de Leitura: 3

Todos estavam comprometidos numa causa comum. Era um trabalho árduo, exigente, mas deveras gratificante, que congregava anualmente a comunidade.

 

Falemos um pouco das suas fases. Comecemos pelo fim: em meados de agosto e durante o mês de setembro, nos planos inclinados daquelas encostas, havia uma agitação invulgar. Vistos de longe, os homens pareciam formar um carreiro de formigas transportando os pesados cestos de uvas por veredas estreitas e íngremes, desafiando por vezes abismos impressionantes. As crianças chegavam às bermas de uma latada, quase rente ao chão, e escondiam-se entre as folhas das vinhas para logo surgirem em lugares inesperados. Já as mulheres desdobravam-se em atividades variadas, ora vindimavam, ora velavam pelos filhos ou preparavam a refeição do dia. Eram grandes e generosas. Habituadas ao desafio constante da maternidade, pareciam adivinhavar o futuro.

 

Algum tempo depois, o outono despia as vinhas. O cenário transformava-se. Iniciava-se um tempo de luto e de expetativa até à prova do novo vinho. Depois era o silêncio. Em fevereiro voltavam a soar os podões. A seleção das condenadas era feita previamente e sua execução estava a cargo dos herdeiros de uma antiga sabedoria. Tudo decorria com a máxima precisão: As cepas ingratas eram arrancadas da terra e as vides amontoadas haviam de servir para adubar a terra ou para acender o lume debaixo das velhas panelas enegrecidas. As remanescentes seriam levadas para atear as fogueiras de S. João, no mês de Junho. De novo, as vides congregam vidas.

 

Na última ceia, em contexto de despedida, Jesus recorre à imagem da vinha para transmitir a indispensável lição da unidade, para que a vida seja viável, para que «todos tenham vida, e a vida em abundância». Ele é a verdadeira videira, a cepa de inigualável qualidade, que dá vida às vides. Aqueles que permanecem nele estão sempre revitalizados e produzem bom fruto. Toda a vinha brava, quando enxertada nele, dá sempre mais e melhor vinho.

 

O discurso foi dirigido a um grupo que ia enfrentar o rigoroso inverno da sua ausência. A perseguição aos rebentos da nova cepa, de frutos marcados pela novidade absoluta, fará com que alguns se afastem. As mãos de um mercenário impiedoso haviam de abrandar o entusiasmo inicial e fazer tremer a fidelidade. Uns não permanecem. Fora da comunhão, sem ser enxertado na verdadeira vide, as uvas serão amargas.

 

Hoje o segredo continua a ser o mesmo: para dar bom fruto e persistir, mesmo que seja em terrenos adversos, é necessário permanecer. As circunstâncias são diversas, mas a tentação de se afastar da verdadeira vide, motivada por razões internas e externas à comunidade, é constante. Conscientes disso, rezamos em todas as Eucaristias: «Lembrai-vos Senhor de toda a Igreja… tornai-a perfeita na caridade, em comunhão com o Papa…». À tentação de fragmentação respondemos com o testemunho da comunhão que não anula a diversidade. Respondemos com a tomada de consciência de pertença a um corpo: esta é a minha família. Esta é a minha casa. Esta é a nossa fé. 

 

Permanecer nesta vinha é um trabalho árduo, exigente, mas deveras gratificante. Depende de cada um de nós. 

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