Se me amardes
A desafiadora recomendação permanece inalterável, não abre exceções e não desiste de nos interpelar em cada manhã: «Se Me amardes, guardareis os meus mandamentos». Se me amardes? A afirmação condicionada assemelha-se a uma provocação para aqueles que desde tenra idade, nos bancos da catequese, aprenderam a repetir o primeiro mandamento, «amar a Deus sobre todas as coisas…». Mas aprendemos a dizer que amamos a Deus como se fosse notas de passagens entre os acordes maiores de alguma sinfonia. A promessa de Jesus só se realiza naqueles que se demoram e se especializam na arte de amar, «com todo o coração, com toda a alma, com todo o entendimento e com todas as forças».
Uma missão nada fácil. Quando nos julgamos entendidos no assunto, Jesus surge de novo e interroga-nos como interrogou Pedro junto ao mar de Tiberíades: «Amas-me mesmo?» Aqueles que passam no exame têm o privilégio de o conhecer. Permanece, por isso, pela ação do Espírito Santo, unido ao Pai à semelhança do Filho, o modelo perfeito do amor.
Por outro lado, aquele que ama sente-se profundamente reconhecido pelo amado. Tal como uma criança cresce reconhecendo-se amada pela mãe, aquele que ama é retribuído no amor. Os que não amam perderam a capacidade de se reconhecerem amados. Vivem como eternos condenados.
Nisto consiste a relação amorosa: o que ama sabe que é amado. Dela brota a vida nova, marcada pela alegria coletiva, como na Samaria, no tempo dos Apóstolos. Dela surgem as obras entre as quais Pedro destaca o testemunho da fé traduzido em razões de esperança. Porque o grande desafio que é feito aos depositários da Palavra é o de serem testemunhas da esperança, isto é, de poderem afirmar de uma forma límpida e natural «sei em quem posso esperar».
Aos homens que se interrogam em quem acreditar?, em quem confiar?, o que devo esperar?, o cristão, como servo do mestre do amor, é chamado a ser sacramento de esperança. «Com brandura e respeito», com a humildade de quem faz uma proposta cujo alcance ainda está por revelar. Com efeito, num ambiente multicultural torna-se necessário aprender o discurso da esperança, traduzido numa linguagem adequada e percetível a todos os homens, inclusive àqueles que sendo criaturas de Deus, repetem a toda a hora, «Deus não existe. Tu não me criaste».
[©P. Nélio Pita, CM]