A mão do Ressuscitado
A despedida de alguém que amamos é quase sempre um mergulho no espaço da melancolia, um reavivar dos medos ancestrais, o temor de voltar a ser abandonado, posto de parte e esquecido. Custa-nos sempre. É contranatura. Somos pó e espírito moldados pelas mãos daqueles que amamos. Temos as suas marcas. Dizer-lhes adeus é impossível. Permanecem em nós. Ressurgem, aqui e ali, da aparente ausência para lembrar uma história ou simplesmente repetir a palavra certa. Estão connosco nas alegrias e partilham o peso dos fardos que transportamos. Assim, a mão que hoje se despede é a mesma que nos tranquiliza: «Eu estarei convosco todos os dias até ao fim dos tempos».
É certo que somos depositários de mistérios antigos, carregamos as incertezas de todos os mortais, por vezes até nos assemelhamos a ilhas de dúvidas sujeitas a toda a espécie de adversidade, mas nele somos também a promessa do reino que se realiza, dia após dia, em cada tempo e lugar. Somos o povo de olhos postos na mão que aponta para o futuro. E a mão do Galileu que se desvanece nos céus é a mesma que se torna visível através dos seus ministros, torna-se presente em múltiplos gestos que os discípulos repetem, gestos de amor incondicional, palavras de esperança, mãos que protegem e constroem. Por isso, a mão erguida para abençoar é a mesma que aponta para um caminho novo: «Ide e ensinai todas as nações…»
A mão tantas vezes enlameada por camadas de terra, a mão desfigurada, tremula e mutilada é a mesma que procura a mão gloriosa do Ressuscitado. Naturalmente. A mão que gesticula repete continuamente a insatisfação pelas muitas coisas a que está presa. Anseia por encontrar e entrelaçar-se com a mão ferida daquele que nos levanta e nos torna forte. A mão que acena é a mesma nos atrai. Ela ajuda-nos a ser o que somos chamados a ser.