O grande banquete

Liturgia 14 outubro 2017  •  Tempo de Leitura: 3

Não existe festa sem uma boa refeição. Acho particularmente belas as refeições partilhadas que, por vezes, coroam as celebrações litúrgicas na nossa paróquia. Nelas partilhamos os contributos individuais, o arroz de pato da Sra. X com a feijoada do Sr. Y, o bacalhau à minhota da Sra. F com o bacalhau espiritual do Sr. M. À volta da mesma mesa, comendo do mesmo prato, bebendo do mesmo vinho, percebemos facilmente o que é ser membro de uma família. As barreiras socioculturais alicerçadas por tradições e narrativas antigas são suspensas ainda que provisoriamente. A surpresa dos paladares e a companhia extraordinária do outro proporciona um raro momento de comunhão. Falamos sobre uma receita, um livro, uma viagem. Falamos sobre as iniciativas da paróquia ou da escola, sobre os filhos, os netos, sobre o estado de saúde e os projetos que nos fazem sonhar. Quando, no fim do dia, retomamos a habitual rotina, as memórias das experiências gratificantes recompensam a sombra que invade o nosso corpo cansado.

 

Segundo as leituras deste domingo, este tempo de festa é uma amostra da eternidade. Uma amostra imperfeita sugerida como um exemplo. Todos são convidados a participar na festa oferecida pelo Rei. Ele oferece tudo: comidas e bebidas, ornamentação, animação e até os trajes. Ele não quer que ninguém alegue falta de meios para justificar a ausência. Sim, aqueles que aparecerem com o “dress code” desadequado poderão ser impedidos de participar.

 

A grande tragédia é apenas uma: contentar-se com as migalhas oferecidas pelo senhor deste mundo. Deixar-se iludir pelas ofertas generosas de banquetes sem fim, sem custo algum. Levados por esta fantasia, consumimos o que nos intoxica. Os produtos que aparentemente nos haviam de dar mais vigor tornam-nos, no entanto, reféns de um senhor estranho. Alimentamos a nossa fraqueza. Permanecemos nesse ciclo vicioso. Comemos da mão que nos envenena.

 

O Senhor da Vida permanece até ao fim, respeitando a liberdade de cada um, na expetativa da nossa participação. Outros virão, aqueles que considerávamos improváveis, e ocuparão os nossos lugares, bem vestidos e dispostos a fazer a festa. Nós continuaremos a repetir o habitual «não tenho tempo».

 

S. Agostinho diz-nos que «a preocupação integral da vida presente é restaurar a saúde ao olho do coração para que Deus possa ser visto». De facto, fomos feitos para estar em comunhão com Ele e seria uma grande pena que a nossa cegueira interior nos impedisse de O reconhecer. Seria um desperdício de tempo e energia recusarmos o seu convite.

 

Mas a festa continua mesmo sem nós. Hoje, aqui e agora.

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail