Fé e dúvida
«A fé e o amor têm de conquistar-se a cada dia através de uma luta com a dúvida. A vitória sobre a dúvida é a única e verdadeira afirmação do crer.»
Este testemunho de um realizador que me é particularmente querido, Ermanno Olmi (1931-2018), recorda um dado que passa muitas vezes negligenciado e até fonte de equívocos ou de ansiedade.
Fé e amor não são apenas fontes de paz e de felicidade. Ao contrário. Basta apenas pensar em Abraão e na sua terrível provação consumada no monte Moriá com a inconcebível ordem divina relativa à morte sacrificial do filho.
Podemos também mencionar a luta noturna de Jacob com o Deus misterioso, oculto sob a forma de um ser forte, ou nos longos e atormentados acontecimentos vividos por Job, sempre pronto a acreditar em Deus.
Crer e amar são duas aventuras da alma que, no entanto, envolvem carne e sangue, inquietam mais que consolam, exigem antes ainda de dar, ferem e exaltam.
É por isso que devemos suspeitar de uma fé demasiado sossegada, que atenua toda a emoção, que não custa e não compromete em demasia, que é demasiado óbvia e não tem de combater com a dúvida. Mas é igualmente verdade que a fé é também serenidade e alegria.
Uma frase significativa de Carlo Bo (1911-2011), professor, crítico literário e senador, diz o seguinte: «Tenho a impressão de que a voz de Deus passa sobre os nossos corações e não deixa rasto. O consenso sem sofrimento que damos a Deus é apenas mais uma maneira, entre tantas, de não lhe responder».
[P. (Card.) Gianfranco Ravasi | In Avvenire]