Dobrar-se
«Não há em toda uma vida coisa mais importante a fazer do que dobrar-se, para que um outro, abraçando-te o pescoço, possa reerguer-se.»
Teve uma vida dedicada ao compromisso político e ao rigor moral e intelectual, em coerência com a sua visão da história. Falo de Luigi Pintor, jornalista e homem político comunista falecido em 2003.
Talvez ele próprio estranhasse ser citado e recordado por um padre numa rubrica de matriz espiritual. Nunca o conheci nem encontrei, mas um amigo comum falou-me sempre dele como de uma pessoa de forte moralidade e sensibilidade, ainda que na diversidade profunda da interpretação do mundo e da vida.
É isso que emerge precisamente da bela, intensa e “cristã” imagem que Pintor deixou no volume “Servabo”, de que extraí a proposta para a nossa reflexão. Uma opção de vida que está toda naquele «dobrar-se», para que quem está por terra, frágil e ferido, possa abraçar-te o colo e, assim, voltar a pôr-se de pé e tornar a percorrer a estrada da vida.
É o gesto do bom samaritano da célebre parábola de Jesus, um homem que não era judeu, antes era considerado um heterodoxo e um estranho à comunidade de eleição, e que Cristo transforma num exemplo não só para os fiéis judeus, mas também para os seus sacerdotes e levitas.
Um gesto que deveria estar no coração da verdadeira política, que deveria ter como regra a ajuda recíproca, assegurando não o primado aos interesses particulares, mas ao cuidado e ao apoio aos últimos e aos fracos.
Um gesto, este de dobrar-se, que foi emblemático para uma multidão de santos e que deveria ser a glória do cristão, demasiadas vezes tentado – como os outros atores da parábola lucana – a «passar além, para o outro lado», altivo e enfastiado pelo grito do sofredor, pelo seu cheiro e pelas suas farpelas sujas.
[P. (Card.) Gianfranco Ravasi | In Avvenire]