Tempo perdido
«Pensai no tempo de que ainda dispondes, mais do que no tempo que vos falta.» Eis-nos no verão, e é fácil deixar-nos tentar pelas maneiras de falar, antigas e constantes («o tempo passa tão depressa!), e as novas («as estações do ano já não são o que eram!»).
Não é, no entanto, um lugar-comum a frase que hoje proponho, redigida por um médico canadiano, William Osler (1849-1919), considerado o pai da medicina clínica moderna.
A consideração é significativa, sobretudo na sociedade contemporânea, tão apressada e frenética: «Falta-me tempo para rezar, para falar com os filhos, para me deter em reflexão», e assim por diante.
E à fúria de repetir estas declarações, há como que uma autoabsolvição dos muitos compromissos a que se falta, talvez até alegando a jurídica asserção latina “ad impossibilia nemo tenetur”, ninguém está obrigado ao impossível.
Na realidade, vê-se que essas mesmas pessoas desperdiçam muito tempo em linguarices, em futilidades, em longas paragens nas lojas, em filas nas autoestradas, numa série de “necessidades” não necessárias impostas pelo estilo de vida atual.
Eis, então, a advertência de Osler: mais do que no tempo que falta, pense-se no tempo disponível e desocupado. É paradoxal, mas muitas vezes fazem-se as coisas importantes à pressa e sem cuidado, repetindo «não tenho tempo!», «tenho muito que fazer», e depois não se sabe como matar todo esse tempo poupado.
O famoso crítico de arte Bernard Berenson (1865-1959) escrevia: «Matar o tempo em vez de o empregar como a verdadeira substância vida vivida, e não simplesmente transcorrida, é sem dúvida o pecado dos pecados».