Respirar, pensar, lutar, amar: os verbos da oração
Com uma certa liberdade filológica, Giacomo Leopardi, no seu "Zibaldone"(1817-1832) associava o verbo «meditar» ao termo latino "medeor", «medicar»: seria, portanto, uma espécie de medicina da alma. É certo que a meditação orante constitui uma necessidade da fé; tanto é assim que a oração constitui um fenómeno antropológico universal. Tentaremos em seguida delinear um mapa essencial da sua estrutura, mostrando as suas recaídas vitais e pessoais. Serão quatro os pontos cardeais deste guia que acompanhará a nossa subsequente peregrinação espiritual no Saltério, como epifania da fé.
O primeiro verbo é «físico»: "respirar", e está ligado – como dizíamos –, ao "os", à «boca» que "orat", «reza». O filósofo Søren Kierkegaard (1813-1855) não hesitava, quando anotava no seu "Diário": «Os antigos diziam, com razão, que rezar é respirar. Assim se vê como é uma tolice falar da razão porque se deve rezar. Porque é que eu respiro? Porque, caso contrário, morreria. O mesmo acontece com a oração.» O teólogo e cardeal Yves Congar (1904-1995), na sua obra "Les voies du Dieu vivant" ("Os caminhos do Deus vivo"), sublinhava este tema: «Com a oração, recebemos o oxigénio necessário para respirar. Com os sacramentos, alimentamo-nos. Porém, antes da alimentação, há a respiração, e a respiração é a oração.» A alma que reduz ao mínimo a oração fica asfixiada; se exclui qualquer invocação, vai sufocando lentamente. Vivendo num ambiente de ar viciado, toda a existência se entristece; o mesmo acontece com a oração, que precisa de uma atmosfera pura, livre de distrações exteriores, aureolada de silêncio.
Daí, portanto, a necessidade de criar um horizonte interior límpido em que seja possível contemplar, meditar, refletir, dirigir-se para a luz de Deus. É interessante esta simbologia «física» para definir a oração. Ela permeia muitas vezes os Salmos, que com frequência criam um sugestivo contraponto entre «alma» e «garganta», porque é um só o vocábulo hebraico que as exprime, "nefesh": «A minha alma / garganta tem sede de Deus, do Deus vivo… Ó Deus, Tu és o meu Deus! Anseio por ti! A minha alma/garganta tem sede de ti; todo o meu ser anela por ti, como terra árida, exausta e sem água» (Sl 42,3; 63,2). São Paulo sublinhava este carácter «físico», que não é apenas orgânico, porque nós não "temos"um corpo, mas "somos"um corpo: «Oferecei os vossos corpos como sacrifício vivo, santo, agradável a Deus. Seja este o vosso verdadeiro culto, o espiritual» (Rm 12,1).
Devemos, portanto, reencontrar a espontaneidade e a constância da respiração orante explícita e implícita, como a mulher do Cântico dos Cânticos, naquela sua magnífica confissão de amor, feita em hebraico, com apenas quatro palavras: "‘anî jeshenah welibbî ‘er", (eu dormia, mas de coração desperto) (Ct 5,2). A fé, tal como o amor, não ocupa apenas algumas horas da nossa existência, também inclui a alma, a respiração constante.
«A oração é, para a religião, aquilo que o pensamento é para a filosofia. O sentimento religioso reza, tal como o órgão do pensamento pensa.» Assim retomou de modo incisivo o poeta romântico alemão Novalis, na mesma língua do filósofo Martin Heidegger (1889-1976), embora de modo inverso, [a frase deste] "denken ist danken", «pensar é agradecer». O segundo ponto cardeal será, portanto, "pensar". A oração não é simples emoção, deve envolver razão e vontade, reflexão e paixão, verdade e ação. Não é por acaso que São Tomás de Aquino considerava «a oração como um ato da razão que aplica o desejo da vontade àquele que não está sujeito a nós, mas que é superior a nós, ou seja, a Deus».
A figura de Maria, delineada pelo evangelista Lucas (2,19), depois de ter vivido a experiência da maternidade divina, é exemplar: ela «guarda as palavras» e os acontecimentos vividos, e no seu coração, ou seja, na sua mente e consciência, «medita-os» – em grego, recorda-os numa unidade transcendente ("symbállousa") –, e esse é o verdadeiro «pensar» segundo Deus. A interligação entre oração e fé pressupõe, precisamente, uma contínua descarga entre estes dois atos, mediante a qual se invoca aquele que se conhece. Assim, é precisamente rezando que o salmista pode afirmar que «Deus se deu a conhecer em Judá» (Sl 76,2). O eu do orante encontra-se e dialoga com o «Eu sou» divino, revelado na sarça ardente do Sinai (Ex 3,14). Quem reza conhece Deus e, à sua luz, conhece-se a si próprio, como sugeria outro filósofo, Ludwig Wittgenstein, nos seus apontamentos de 1914-1916: «Rezar é pensar no sentido da vida.»
Há, porém, um terceiro e surpreendente ponto cardeal da oração: o "lutar". O pensamento evoca de imediato a cena bíblica noturna que tem lugar nas margens do Jaboc, afluente do Jordão (Gn 32,23-33): aí, Jacob luta com o Ser misterioso que, no fim, continua a ser o Desconhecido, mas cuja força é tal que consegue mudar o nome do seu interlocutor de Jacob para Israel, mudando, assim, a sua vida e a sua missão. Também é Ele que o golpeia no corpo, deslocando-lhe a articulação do fémur, ferindo-o na sua existência, e que o abençoa, lançando-o numa nova história («o sol principiara a levantar-se, quando Jacob deixou Penuel…»). Ora, é curioso notar que o profeta Oseias interpretou esta experiência do patriarca bíblico como uma invocação dirigida a Deus e, por isso, como uma oração: «Lutou com o anjo e venceu-o, chorou e implorou misericórdia» (Os 12,5). A esta dimensão da oração e da fé deveremos dedicar muito espaço, porque a forma dominante da oração sálmica é, precisamente, a «súplica».
Ela brota da dor, torna-se interrogação dilacerante dirigida a Deus, experimenta também o silêncio e a ausência divina, encarna-se no grito sálmico repetido por Cristo na cruz: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» Reproduz-se no protesto contínuo de Job, que chega ao ponto de sentir Deus como uma fera «que range os dentes contra mim e me olha com olhos terríveis… agarrou-me pela nuca e fez-me em pedaços… Disparou as suas setas contra mim… Despedaça-me com feridas sobre feridas, atira-se sobre mim como um guerreiro» (Jb 16,9-14).
Já era esse «combater/lutar» com Deus que explicava o nome «Israel», segundo a Bíblia (Gn 32,29), e que Job sublinha no seu incessante lamento: «Eu vou falar com o Todo-Poderoso e desejo discutir com Deus» (Jb 13,3). É, ainda, aquela noite do espírito que envolve grandes místicos como São João da Cruz, que, no entanto, com as célebres estrofes do seu "Cântico espiritual", partindo, precisamente, da ausência tenebrosa, nos conduz até ao último ponto cardeal luminoso, o da presença amorosa e do abraço íntimo: «Onde é que tu, meu Amado,/ te escondeste deixando-me em gemido?/ Fugiste como o veado,/ havendo-me ferido;/ chamando eu fui por ti: tinhas partido!...»
No fim, então, temos o encontro: o quarto verbo da oração é "amar". Este traça a meta suprema da oração e da fé que se exprime mediante o outro género dominante do Saltério, a par da súplica, ou seja, o do louvor confiante e jubiloso. Algumas espiritualidades sublinham sobretudo a transcendência, a inacessibilidade divina, que deve ser apenas contemplação, admirada e celebrada, mas que é difícil amar. Os antigos sumérios cantavam ao deus Enlil pelas «suas múltiplas perfeições, que nos deixam atónitos», conscientes, porém, que ele era «como um novelo emaranhado que ninguém sabe desembaraçar, um emaranhado de fios cuja ponta não se vê». O próprio Islão também exalta a inatingível glória divina, um sol ofuscante que, no máximo, deixa um reflexo na poça de água que é o homem, para usar uma imagem desta religião.
Contudo, o verdadeiro sustentáculo da oração é a intimidade entre o fiel e o seu Deus; tanto é assim que a própria espiritualidade muçulmana tende para esse abraço. Com efeito, Rabi’a, a mística de Bassora do século VIII, sob o firmamento estrelado do Oriente, cantava: «Meu Senhor, no céu brilham as estrelas, os olhos dos enamorados fecham-se. Cada mulher enamorada está sozinha com o seu amado. E eu estou aqui, sozinha contigo.»
Na fé cristã, a intimidade é plena porque Deus é invocado como "’abba"(«papá»), na "oratio dominica"por excelência, o "Pai-nosso", escolhido por Jesus como oração distintiva do cristão. Já não é apenas um Deus acerca do qual falar, mas ao qual falar num diálogo em que os olhares se cruzam. É o momento da oração silenciosa: «contemplai-o e ficareis radiantes», cantará o salmista (cf. 34,6). É a mesma experiência dos enamorados que, terminado o colóquio das palavras, se olham nos olhos. É essa a linguagem mais intensa e doce, mais verdadeira e íntima, como sugeria Pascal, convencido de que na fé, tal como no amor, «os silêncios são mais eloquentes do que as palavras».
Adotemos, então, a mesma atitude do orante bíblico do Salmo 123, numa delicada e terna permuta de olhares, entre o fiel e o seu Deus: «Levanto os meus olhos para ti, Senhor, para ti que habitas nos céus. Como os olhos do servo se fixam nas mãos do seu amo, e como os da serva, nas mãos da sua ama, assim os nossos olhos estão postos no Senhor, nosso Deus, até que tenha piedade de nós» (vv. 1-2). É deste entrecruzar silencioso dos olhares que brota a contemplação orante.
[Card. Gianfranco Ravasi | In "O grande encontro entre Deus e a sua criatura", ed. Paulinas]