Uma Semana para estar junto das feridas de Jesus
A entrada de Jesus em Jerusalém (Marcos 14,1-15,47) não é apenas um acontecimento histórico, mas uma parábola em ação. Mais: uma armadilha de amor para que a cidade o acolha, para que eu o acolha.
Deus corteja a sua cidade (a fé é a minha resposta ao cortejamento de Deus): vem como um rei mendicante, tão pobre que nem sequer possui o mais pobre dos animais de carga). Um Poderoso humilde, que não se impõe, antes propõe-se; como um amante desarmado.
Bendito Aquele que vem. É extraordinário poder dizer: Deus vem. Nesta região, por estas estradas, na minha casa que sabe a pão e abraços, Deus continua a vir, viandante dos milénios e dos corações. Aproxima-se, está à porta.
A Semana Santa desdobra, um a um, os dias do nosso destino; vêm ao nosso encontro, lentamente, cada qual generoso de sinais, de símbolos, de luz. Nesta semana, o ritmo do ano litúrgico torna-se mais vagaroso, podemos seguir Jesus dia após dia, quase hora após hora.
A coisa mais santa que podemos fazer é estar com Ele: «Homens e mulheres vão a Deus no seu sofrimento, choram por ajuda, pedem pão e conforto. Assim fazem todos, todos. Os cristãos, por sua vez, estão próximos a Deus no seu sofrimento» (Bonhoeffer).
"Crucificação" | Masaccio | C. 1426
Os cristãos estão próximos de um Deus que na cruz já não é “o todo-poderoso” dos nossos desejos infantis, o salva-vidas dos nossos naufrágios, mas é o Todo-abraçante, o Todo-amante que naufraga na tempestade perfeita do amor por nós.
São dias para estar próximo de Deus no seu sofrimento: a paixão de Cristo continua a consumar-se, em direto, nas infinitas cruzes do mundo, onde nós podemos estar junto aos crucificados da História, deixar-nos ferir pelas suas feridas, experimentar a dor pela dor da terra, de Deus, do ser humano, padecer e levar conforto.
A cruz desorienta, mas se persisto a ficar junto a ela, como as mulheres, o olhá-la como o centurião, perito em morte, decerto não compreenderei tudo, mas uma coisa sim: que ali, naquela morte, está o primeiro vagido de um mundo novo.
O que viu o centurião para pronunciar, ele que era pagão, o primeiro acabado ato de fé cristão, «era o Filho de Deus»? Viu um Deus que ama ao ponto de morrer.
A fé cristã apoia-se na coisa mais bela do mundo: um ato de amor perfeito. Viu a subversão do mundo; Deus que dá a vida inclusive a quem lhe dá a morte; Aquele para quem o poder é servir em vez de se servir; vencer a violência não com mais violência, mas tomando-a sobre si.
A cruz é a imagem mais pura, mais alta, mais bela que Deus deu de si mesmo. São os dias que o revelam: «Para saber quem é Deus, só tenho de me ajoelhar aos pés da Cruz» (Karl Rahner).
[Ermes Ronchi | In Avvenire]