Santificar a comunicação: Onde está o Evangelho nos ataques nas redes?

Pastoral da Comunicação 4 agosto 2021  •  Tempo de Leitura: 6

Um rio de palavras transborda da boca de cada um, para demonstrar que tem razão. Tantas vezes a instintividade ganha asas e, sem fundar as suas razões com o debate, cada qual luta para vencer e enterrar o outro.

 

Cada ocasião pode tornar-se num campo de batalha, sobretudo quando estamos convictos de que o outro está sempre errado. Somos muito corajosos, com efeito, a relevar os seus aspetos negativos e a ridicularizá-los, para julgar, criticar e condenar o interlocutor, descarregando sobre ele toda a responsabilidade pelos acontecimentos.

 

O campo neutro desaparece e emerge a vingança, a raiva que provém do ressentimento ou do desafio, para demonstrar que se é o melhor.

 

Deixámos de ser guardadores do silêncio, que permite a cada pessoa estar com tudo o que é juntamente com o outro sem preconceitos, em atitude de quem sabe que pode aprender uma dimensão desconhecida da narração, não necessariamente em contraposição às próprias ideias.

 

Se a pessoa apresenta uma identidade esboroada, esta reflete-se na atitude, e portanto sobressai na expressão verbal, comportamentos, etc. Ela tenta desesperadamente unificar num puzzle os seus pensamentos e sentimentos, mas habitualmente exprime-se com uma comunicação que não se mostra linear, fundada, direta, respeitosa, espontânea, simples, coerente, íntima


Já não cuidamos do silêncio que nos permite entrar em contacto com a profundidade de si animada pelo Espírito de Deus, para dele chegar ao mesmo comprimento de onda, para permanecer sempre em relação.

 

Deixámos de imergir no silêncio que educa para a busca, para aprender, aprender sempre, para não ficarmos bloqueados no que já se fez, antes descobrir novos horizontes que podem tornar possível a mudança.

 

Quando defendemos as nossas ideologias criamos um muro na comunicação e empobrecemos. A defesa a todo o transe do próprio pensamento impede-nos de nos colocarmos à escuta do outro em vista do bem comum, de fazermos a análise concreta e objetiva da situação e não ter uma visão global da realidade.

 

A ostentação daquilo que se faz, chegando ao ponto de atribuir a si próprio méritos infundados, e a denigração dos outros conduzem a um recontro contínuo.

 

Escreve o papa Francisco na “Alegria do Evangelho”: «O todo é mais do que a parte, sendo também mais do que a simples soma delas. Portanto, não se deve viver demasiado obcecado por questões limitadas e particulares. É preciso alargar sempre o olhar para reconhecer um bem maior que trará benefícios a todos nós» (n. 235).

 

Cada um de nós é chamado a acolher o outro na diversidade, consciente de que desencadear a luta do muro contra o muro só conduz à destruição de ambos, ainda que aparentemente vencedores


Se a pessoa apresenta uma identidade esboroada, esta reflete-se na atitude, e portanto sobressai na expressão verbal, comportamentos, etc. Ela tenta desesperadamente unificar num puzzle os seus pensamentos e sentimentos, mas habitualmente exprime-se com uma comunicação que não se mostra linear, fundada, direta, respeitosa, espontânea, simples, coerente, íntima.

 

A unificação da pessoa, que parte do sentido da sua vida, permite a cada uma estar sempre em relação, ter o outro no coração, medir cada palavra dirigida ao tu frontal para que não fique ferido e com o qual se pode construir um mundo mais humano.

 

Cada um de nós é chamado a acolher o outro na diversidade, consciente de que desencadear a luta do muro contra o muro só conduz à destruição de ambos, ainda que aparentemente vencedores. Quando não somos guardiães da pessoa real, todos nós perdemos.

 

Se o sentido da nossa vida é Jesus e o seu Evangelho, terá a sua Palavra passado de moda? Onde colocamos o Evangelho nas nossas disputas, nos ataques frontais, nas murmurações, nas calúnias, nas construções de factos inexistentes que visam destruir o outro, em persistir, inclusive com agressividade, em ideologias pela defesa do indivíduo e não pelo bem real da pessoa?

 

Talvez tenhamos perdido pelo caminho a relação com o Senhor, tornando a incarnação de Jesus Cristo evanescente: com os factos dizemos que não há tempo para Ele… nem para nós


O que falta para sermos constantemente iluminados pela Palavra do Senhor nos pensamentos, nos sentimentos, nas ações, para levarmos a todo o lado um pouco de ar fresco que fale de acolhimento, de respeito, de silêncio, de escuta, de partilha, de cuidado, de dom, de bem comum, de perdão e de misericórdia?

 

Provavelmente construímos um Deus à nossa imagem e semelhança que, no quotidiano da nossa vida, exumamos durante os ritos, e que, no dia a dia, deixamos na gaveta como um talismã. Talvez tenhamos perdido pelo caminho a relação com o Senhor, tornando a incarnação de Jesus Cristo evanescente: com os factos dizemos que não há tempo para Ele… nem para nós.

 

É urgente regressar ao contacto real connosco próprios, para cuidar da vida segundo o Espírito e testemunhar Cristo sempre e em todo o lado, com o olhar voltado para os homens e mulheres que encontramos.

 

Da opção diária de um outro modo de viver, verdadeiramente humano e divino, inicia a credibilidade da presença do Senhor ressuscitado na História, que se revela já na santificação da comunicação e das relações com cada pessoa.

 
[Diana Papa | In SIR]

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