Conto: «O portinho da fraternidade»
Era uma vez um velho rei que queria conhecer melhor a alma do seu povo e decidiu percorrer o país, vestido com umas pobres roupas de lavrador para que ninguém o conhecesse. Ao chegar a uma aldeia da planície, palmilhou algumas ruelas e estranhou que as pessoas o olhassem com algum desdém e lhe virassem a cara quando ele se aproximava para as cumprimentar. Então, o rei identificou-se, pediu que toda a população se reunisse na praça central e disse-lhes:
- Como estou triste convosco. Ninguém foi capaz de olhar para mim com estima. Sem um sincero sentimento de fraternidade, os homens nunca se relacionarão uns com os outros como membros da mesma família humana e, então, em vez de viverem como irmãos, lutarão entre si como adversários ou inimigos e destruir-se-ão irremediavelmente. É impressionante como a inteligência humana foi capaz de conhecer e explorar o planeta e levar-nos à lua e de pouco nos tem servido para descobrirmos e reconhecermos que os outros são nossos irmãos. Conseguimos aprender a voar como as aves e a nadar como os peixes e achamos muito complicado aprender a sentir-nos e considerar-nos todos uma só família. Vou embora desolado.
O rei foi-se embora e, ao entrar num vilarejo da montanha, decidiu bater à porta de algumas casas e pediu uma esmola nalgumas e noutras um pão ou uma sopa. Como poucos o acolheram com misericórdia, aproximando-se de algumas pessoas que estavam na conversa junto à igreja, disse:
- Eu tenho vergonha de ser o rei de um país, onde a fraternidade parece uma palavra oca. O ser humano diz amar a Deus, que é uma realidade transcendente, imaterial e invisível, e, muitas vezes, odeia o seu irmão, o seu vizinho ou o seu colega, que estão ao seu lado e são bem visíveis. É imprescindível compreendermos que fomos feitos para vivermos como irmãos e só assim a vida terá sentido e conseguiremos ser felizes. É triste pensar que, mais vezes do que seria desejável, o coração humano está mais inclinado para o egoísmo e a maldade do que para a fraternidade e o amor.
Então, o velho monarca saiu dali entristecido e dirigiu-se para uma cidadezinha que se situava junto a um grande lago. Para não variar, também ficou mal impressionado com as suas gentes pois se uns andavam pelas ruas como se não conhecessem ninguém, outros discutiam e até se revelavam agressivos. Então, o rei mandou reunir a população junto a uma árvore e disse-lhes amargurado:
- Como rei, tudo fiz para construir um país próspero, unido e em paz, mas a verdade é que não parecemos uma só família nem nos tratamos como irmãos. A nossa vocação é o amor e se todos dermos as mãos uns aos outros, não conseguiremos pegar em armas para nos matarmos. Mais do que pensar da mesma maneira e fazer da mesma forma, a fraternidade convida-nos, a pensarmos juntos e a fazermos as coisas uns com os outros. Nem sempre os irmãos são verdadeiros amigos, mas os amigos autênticos viverão sempre como irmãos e a diversidade e a complementaridade são uma riqueza enorme que nos faz ir muito mais além.
O rei, já desesperado, saiu dali e foi até uma aldeia junto ao mar. Ao ver chegarem dois barcos do mar, deu-se conta da união e a alegria de toda a gente a ajudar nas tarefas da pesca e na distribuição do peixe por toda a gente. Para seu espanto, vários pescadores aproximaram-se e convidaram-no a jantar com eles e a passar ali a noite. O rei, sem saber bem o que dizer ou fazer, aceitou e disse à população:
- Sou o vosso rei e, sem o saberdes, reconhecestes em mim um irmão. O futuro do reino e da humanidade está assegurado enquanto houver pessoas boas como vocês. A verdadeira felicidade está em partilhar o que temos e somos com os outros. Por isso, vou recompensar-vos com a melhoria das vossas casas e dos vossos barcos e vou chamar à vossa terra Portinho da Fraternidade por serdes um exemplo para todos.
O velho rei conviveu com aquela gente simples como se fossem verdadeiramente seus irmãos e regressou ao seu palácio com o coração cheio de alegria e esperança.