Conto: «O caminho de Santiago»

Conto 16 janeiro 2025  •  Tempo de Leitura: 5

Era uma vez um rapaz que decidiu fazer o Caminho de Santiago. Sempre alimentara o sonho de ir a pé, ao jeito dos peregrinos medievais, por entre montes e vales, em direção à catedral da cidade espanhola onde se encontra o túmulo do apóstolo Tiago Maior.

 

De mochila às costas e com um cajado nas mãos, o rapaz iniciou a sua caminhada a pouco mais de uma centena de quilómetros de Santiago de Compostela, guiado por setas amarelas que se avistavam por todo o lado. Como o frio e a chuva foram os primeiros grandes obstáculos, o rapaz ficou logo desanimado, mas admirava-se com o vigor dos peregrinos que passavam por ele e o cumprimentavam com um sonoro ‘Buen Camino’. Um dos caminhantes, um idoso de olhar sereno e feliz, disse-lhe:

 

- Ultreia! A persistência é imprescindível para alcançar o sucesso e o mais importante caminho para conquistar os nossos sonhos. Só com paciência e perseverança será possível chegares a Santiago. O êxito depende da nossa determinação em fazer tudo para se concretizarem os nossos projetos e objetivos e a verdadeira felicidade reside no empenho, no esforço, na coragem e no sofrimento e não propriamente nas vitórias que conseguimos alcançar. Ânimo e fé. O Caminho depende disso!

 

O rapaz agradeceu as palavras do velho peregrino que lhe explicara que a palavra latina que utilizara significava ‘vai em frente… mais além… coragem’ e lhe disse que já tivera vontade de desistir durante as centenas de quilómetros que já calcorreara, mas que nem percebia onde é que ia buscar as forças para continuar. No final da segunda etapa, o rapaz sentiu-se completamente esgotado e com vontade de regressar a casa pois não aguentava mais as dores nas costas e nas pernas. Para sua surpresa, o velho peregrino que conhecera no dia anterior foi pernoitar no mesmo albergue e logo se ofereceu para lhe passar um creme, dizendo:

 

- Suseia! Era como os peregrinos medievais respondiam à saudação Ultreia e significa ‘vamos lá… estamos juntos’. Olha, a nossa maior fraqueza está na decisão de desistir, pois não somos derrotados quando perdemos, mas quando não queremos continuar a lutar. O caminho mais certo para nos conduzir à vitória é tentar uma vez mais. A nossa maior glória não está em não cairmos, mas em nos levantarmos sempre depois das nossas quedas. Se nos cansarmos, a solução é descansar e não desistir.

 

No terceiro dia, o rapaz sentia-se regenerado, pois as mãos do ancião tinham feito milagres. Por entre bosques, montanhas, campos e aldeias, a etapa foi dura e as muitas subidas e descidas provocaram várias bolhas nos pés e o caminhar tornou-se tremendamente lento e doloroso. Enquanto descansava debaixo da sombra de uma árvore e estava, mais uma vez determinado em abandonar a aventura, para seu espanto, voltou a aparecer o ancião que imediatamente se ofereceu para lhe tratar das bolhas e, depois de lhe referir que já tinha tido muitas, disse-lhe:

 

- Olha, as bolhas são uma espécie de medalhas dos peregrinos. As coisas grandes da vida não se alcançam pela força, mas pela persistência pois ela tem a virtude de ultrapassar os obstáculos. Nem a vida nem o Caminho são uma corrida de velocidade, mas uma maratona que se faz passada a passada. Na verdade, a vida é um exercício quotidiano de paciência, perseverança e superação. Vamos, eu sei que tu és capaz.

 

No quarto dia, os marcos dos caminhos diziam que faltava cada vez menos para chegar ao ‘campo de estrelas’ e nem uma queda dolorosa nem o sol quente conseguiram fazer desistir o rapaz. A quinta e última etapa do Caminho começou bem antes do amanhecer e, ao chegar ao meio-dia à Praça do Obradoiro, o rapaz sentou-se a contemplar a Catedral de Santiago e chorou de felicidade. O velho peregrino abraçou-o e disse-lhe:

 

- Há pessoas que fazem o Caminho e há outras, como tu, a quem o Caminho faz pessoas. O Caminho é a metáfora da existência e se tu conseguiste fazê-lo, então tudo será possível na tua vida. É evidente que o Caminho te transformou e consigo ver em ti o que se dizia dos peregrinos da Idade Média: um canto nos lábios e uma estrela na fronte. E não te esqueças que o verdadeiro caminho começa agora. Buen Camino!

Paulo Costa

Conto

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