A casa também é tua

Crónicas 11 junho 2021  •  Tempo de Leitura: 5

São seis e meia da tarde. O Sol ainda marca a sua presença e dá sinais de que ainda ficará por um bom tempo. Afinal esta é a sua altura do ano e, como tal, tem de mostrar todo o seu esplendor de luz e aconchego. Poucos são os que se encontram pelas ruas que vou pisando em direção à Igreja. Os que por ali se encontram saúdo-os e, espantados por verem alguém a descer, respondem de igual forma.

 

Os seus olhares ficam-me marcados. E, à medida que me vou aproximando da Igreja, os olhares daqueles que se cruzam comigo são de espanto e intriga. Talvez muitos não saibam que há missa durante a semana. Outros, se calhar, devem ficar a pensar: “Então, mas ainda há jovens que vão à missa? E durante a semana?".

 

Chego à porta e o Sol aponta para algo maior. Está empenhado em iluminar o sacrário como que a dar as boas-vindas a quem se arrisca a entrar. O silêncio dá-me a certeza de que estou em casa. O cheiro dos bancos, das flores e das pedras fazem-me recordar os tempos de criança em que entrava de mão dada com a minha mãe. Repito novamente para mim: "Sim, estou em casa.".

 

Dirijo-me aos lugares da frente. Não para tomar destaque, mas para estar mais perto da festa. Mais perto da mesa e do banquete. E tento imaginar como é que tantos homens e mulheres se aproximavam quando se apercebiam que Jesus vinha para comer e beber com eles. Ao olhar ao meu redor, apercebo-me que não deveria ser muito diferente do que acontece hoje. Alguns à entrada da porta a ver como é. A tentarem perceber se realmente há lugar para descanso e acolhimento ou se têm de fugir a sete pés. Outros já se sentam a meio da Igreja. Estão agora mais perto da mesa, pois já vieram experimentar do banquete e deixaram-se enamorar. Há também os que sempre estão. Já com lugares marcados e rotinas vincadas. Presencio tudo isto, e reparo que efetivamente estou em casa. Com pessoas que conheço e outras que não lhes sei o nome. Conheço-lhes apenas o olhar, mas dão-se-me a conhecer pelo mesmo Senhor. Pelo mesmo amor.

 

São agora sete horas da tarde. O sino toca em tom alegre (pelo menos para mim) a dar bons sinais das horas da nossa vida. Está lançado o convite para todos se juntarem. Sim, é o sino que o anuncia em cada badalada. Há uma só intenção marcada para a missa de hoje, mas o silêncio, os rostos e as posturas mostram-me que a Igreja está repleta de orações. Com as mais variadas histórias. Cada um traz consigo o que de mais íntimo tem para colocar ali. No altar. Agradecimentos, perguntas sem resposta, revoltas, alegrias, conquistas, derrotas, promessas, saudades... não interessa o que seja, pois certamente caberá tudo na Sua mesa.

 

A missa termina e fica o desejo e a vontade de querer voltar, mas com mais gente. Dá vontade de trazer todos, porque ali é efetivamente um lugar para todos. Mas se o é, porque não vêm? Não o saberão? Ou nós, nunca tivemos o cuidado de lhes dizer?

 

No caminho para casa as questões vão aumentando. Pergunto-me se não estará na altura de voltarmos à essência dos primeiros cristãos. De nos revestirmos de alegria. De nos deixarmos inundar pelo amor e isso ser motivo suficiente para quererem estar e entrar connosco. Pergunto-me se não estará na altura de nos deixarmos de moralismos e manias e dedicarmo-nos efetivamente em preparar a mesa para quem tem fome e sede das mais variadas formas.

 

Chego com a certeza de que estive em casa, mas com a tristeza de saber que muitos não a conhecem ou que não sabem que também pode ser sua.

 

Hoje ao chegar ao meu lar não tenho dúvidas. A Sua casa é lugar de todos e para todos. Independentemente do que sejam ou façam. Cabe a mim. A ti. A nós... mostrarmos isto mesmo: de que não há nada que nos possa deixar de fora da Sua festa!

 

Sim, a casa também é tua.

Nasceu em 1994. Mestre em Psicologia da Educação e do Desenvolvimento Humano. Psicólogo no Gabinete de Atendimento e Apoio ao Estudante e Coordenador da Pastoral Universitária da Escola Superior de Saúde de Santa Maria. Autor da página ©️Pray to Love, onde desbrava um caminho de encontro consigo mesmo, com o outro e com Deus.

 

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