Ainda há quem nos olhe
Ainda há quem nos olhe. Sem segundas intenções. Sem a pressa de nos tirar medidas. Sem a tentação de formar julgamentos. Existe quem nos olhe de verdade. Há quem ainda comunique com o olhar. Usam a linguagem do silêncio para que não fique nada por dizer. Utilizam a gramática da proximidade para que nada em nós fique de lado. Têm o discurso da autenticidade e, por isso, agarram-nos por inteiro.
Ainda há quem nos olhe. No meio de tanta azáfama e preocupações, ainda há quem se deixe abandonar. E esse encontro, centrado no olhar, vai-nos falando de vida e de amor. Vai pronunciando bem baixinho como é que se vive perante o mistério da vida. Sem desejar que este seja desvendado, mas permitindo que seja atravessado com tudo o que somos, temos e fazemos.
Ainda há quem nos olhe. De um jeito que mais ninguém nos consegue decifrar. Existe quem num instante leia a nossa existência tantas vezes redigida em linhas distorcidas. Há, na nossa vida, quem entre pelas janelas da nossa alma. São gente que se deleita na nossa história permitindo que aceitemos a nossa imperfeição.
Ainda há quem nos olhe. Com mansidão. Com a doçura de nos amparar em todas as quedas. Com a amabilidade de nos acolher com a nossa inteireza. Com a cumplicidade de nos dar a conhecer o que são sem que seja necessário outro dialeto.
Quem são estes que nos olham? Quem são estes que se fazem próximos? Quem são estes que preenchem os nossos dias? Quem são estes que nos acalmam as tempestades e nos animam para a bonança? Quem são estes que utilizam o vocabulário do humanismo?
Ainda há quem nos olhe em presenças vivas e cheias de pureza. Deixando que olhos comuniquem a indecifrável forma de se viver em doação.
Hoje, pensa em todos/as que fazem parte da tua vida e questiona-te: quantos me olham de verdade? Quantos olhares conseguem ler a minha vida?