Estar ao serviço da vida onde a vida acontece
Como me recordou recentemente um jovem, corremos o risco de nunca estarmos aqui e agora. A mente está sempre projetada para os meses e para as atividades vindouras, a própria felicidade está no futuro… De facto, corremos o risco de não viver bem o presente, de não usufruir plenamente da beleza das relações humanas e do que foi preparado para agora, porque continuamos com a cabeça voltada para o que se vai ter que fazer e viver...
Existe um exército de ocupados, de eternos ocupados que vivem a correr. Eles não conseguem encontrar tempo para si mesmos, para a família, para os amigos. Claro que também não tempo para cuidar da sua fé, quando a fé ainda resiste… Na verdade, a fé é como um ente querido: se eu não tiver tempo exclusivo para ele, corre o risco de se perder. E mesmo que ele não me esqueça, sou eu que, aos poucos o esqueço. E o amor, quando não é cuidado, deixa de ser amor e morre.
Mas existe outro exército. Aqueles que não trabalham ou não podem trabalhar. Não só os desempregados, mas também os doentes, os idosos. Para eles, que não têm o que fazer ou nada podem fazer, o tempo é demais. É tempo que não passa, tempo de cansaço, tédio, tristeza.
Pode dizer-se que estes dois exércitos são ambos formas de distração, de incapacidade de aderir verdadeiramente aos acontecimentos da vida, quer seja por excesso, quer por defeito, do que temos que fazer ou que não podemos fazer.
O que nos salva desse risco? O cristão tem, a nível espiritual, a liturgia. A celebração eucarística acompanha o tempo litúrgico nos seus momentos específicos, o que ajuda a não ter pressa e a ter tempo para viver no presente. Se a esta juntarmos a oração pessoal que nos obriga a algumas pausas, o tempo deixa de ser tão tirânico.
Acredito também, que as relações humanas, especialmente aquelas informais que temos com familiares e amigos são decisivas para diminuir o ritmo. Sair para jantar com a família ou com os amigos, com os quais se construiu um bom relacionamento ao longo dos anos. Também podemos encontrar junto dos pobres, doentes e todos os desamparados da vida, a âncora que nos agarra ao presente e nos permite estar ao serviço da vida onde a vida acontece.
Precisamos de muito equilíbrio, precisamos de amigos que nos ajudem nisso e precisamos de oração, que nos permita, não só não perder a relação com Jesus Cristo, mas também a relação com a realidade e com a vida dos seres humanos.
Uma Santa Quaresma.