Ainda há gente (muito) boa!
Não sei como vamos conseguindo trazer o coração e a alma à tona dos dias, quando nos obrigam a chafurdar, numa base diária, em notícias horrorosas. Vamos passando os olhos por um pouco de tudo: ou a guerra, ou os abusos, ou os maus-tratos, violência em todas as formas e feitios. Obrigam-nos a enterrar a alegria na “força do ódio”, do abanar de cabeça de espanto permanente.
Enquanto os dias se desfiam, esperamos pouco. Esperamos que as pessoas sejam mesquinhas, traiçoeiras, que nos queiram enganar ou passar a perna pelo simples gozo de nos ver de nariz a beijar o chão.
É precisamente neste cenário de pouca bondade e justiça que, por vezes, a vida nos permite encontrar pessoas boas. Pessoas que ainda valem a pena. Pessoas que ajudam os outros porque é essa a cor do sangue que lhes corre nas veias do peito e da alma. Ali, num salão de cabeleireiro de bairro, mora e trabalha uma D. Fernanda que prefere que nem se dê por ela. Mais vale ouvir do que falar, diz ela. E é isso que faz. Dá espaço aos “velhos” da sua rua e do seu bairro e deixa-lhes a porta aberta. Deixa que entrem como quem entra na sua casa. Sabe-lhes de cor as manias, as conversas, os hábitos e as dores já habituadas. Conhece-lhes o sentido de humor. Ou a falta dele. Abre-lhes os braços e o coração só com o simples facto de existir. Poisam à sua beira como pássaros que sabem onde é o ninho e que sabem onde é seguro aterrar. É ali. Numa rua que ninguém conhece, e que não faz as notícias e os telejornais, que mora uma alma boa. Que cuida dos outros como quem nasceu para o fazer. Que não sente já as próprias dores por serem muitas. Mas que nunca parece cansar-se de aliviar as alheias.
Há pessoas que fazem muito, com tão pouco.
Há pessoas que ainda são boas só por ser. Ninguém sabe delas, e muito menos quem são. Só a conhecem os que precisam de a conhecer. Basta-lhe isso e a certeza de que a vida é curta. Que enquanto cá andarmos, só vale a pena viver para dar.
Ainda há gente muito boa por aí. E por todas as vezes em que tanta gente se pode esquecer de lhe(s) agradecer, hoje agradeço eu.