Devíamos morar num olhar
Devíamos morar num olhar. Não deveríamos querer outra coisa senão morar num encontro íntimo que nos preenchesse por completo. Este deveria ser o nosso propósito: vivermos num olhar que nos aceita, que nos chama a sermos mais e fazermos disso a nossa verdadeira casa.
Devíamos morar num olhar. Num olhar que desvenda toda a nossa narrativa e que dispensa de qualquer legenda. Sabermo-nos amados, porque olhados. Olhados profundamente sem que o mistério seja resolvido, sem que a nossa história seja julgada. Olhados para que assim sejamos tocados.
Devíamos morar num olhar. Num olhar que nos aconchega com promessas de uma vida cheia de esperanças. Num vislumbrar que nos permita acreditar que há muito mais para além daquilo que vemos ou contemplamos. É ali naquele encontro face a face que o silêncio vai descrevendo tudo aquilo somos. É ali, no alinhamento dos nossos passos mal andados, que aceitamos e resolvemos o nosso passado.
Devíamos morar num olhar. Onde mais podemos deixar o peso de existir? Onde mais permitiremos que a nossa alma dance? Onde mais buscaremos a plenitude do que somos? Onde mais podemos encontrar a vida?
Devíamos morar num olhar. E, assim, deixarmo-nos elevar até ao céu. Até ao nosso céu. Até ao céu de quem se encontra connosco. Devíamos morar num olhar e deixar que tudo em nós fosse renovado. Assim, revigorados com a alegria de podermos ser. Mais autênticos e verdadeiros. Eternamente alegres e consolados por nos sabermos acolhidos no mesmo céu.
Devíamos morar num olhar que nos permita recomeçar com uma força ferida, que é semeada de hospitalidade e de cura autêntica. Devíamos morar num olhar e assim jamais nos perdermos de vista.
Hoje, antes de te refugiares, pergunta-te sinceramente: quantos olhares te acolheram?