«Quando morre um velho, é uma biblioteca que arde.»
Na Bíblia, uma longa vida, é sinónimo de bênção. Mas, já não é assim para a cultura ocidental. Numa sociedade tão utilitarista como a nossa, poderá vir a sê-lo se amadurecer uma consciência, que se traduza fundamentalmente num programa social e não apenas numa questão religiosa. Sem isso, a bênção de uma longa vida pode transformar-se numa maldição.
O terceiro Dia Mundial dos Avós e dos Idosos que se celebrou no passado domingo, teve como tema: “A sua misericórdia passa de geração em geração”.
A bondade do plano salvífico de Deus manifesta-se a cada geração e é transmitida de geração em geração. É por isso que o Papa Francisco recorda com frequência a riqueza inerente ao encontro entre jovens e idosos. É um lembrete decisivo para o futuro da sociedade envelhecida, que muitas vezes deixa os idosos sozinhos. O Santo Padre convida-nos a tomar consciência da importância dos idosos na vida da sociedade e das nossas comunidades, e a fazê-lo não de forma episódica, mas estrutural.
Enquanto no passado a experiência da vida longa representava um valor acrescido, no contexto contemporâneo, a longevidade nem sempre é uma bênção. Os idosos eram considerados sábios. Hoje valoriza-se a juventude e a velhice constitui uma das grandes questões sociais e humanas mais problemáticas, a repensar e revalorizar, pois todos para lá caminhamos...
Portanto, hoje essa consciência parece nublada. Nas cidades, assim como nas aldeias, os idosos, cada vez mais numerosos, apesar das deficiências e dificuldades dos sistemas de segurança social, começam a ser considerados supérfluos, ou mesmo perigosos, porque consomem muitos recursos.
A solidão é a regra, enquanto as felizes exceções são os casais que ficam juntos até o fim. A sociedade, outrora fundada na família, transformou-se numa sociedade para corações solitários. Até as casas de hoje, pelo preço e pelo número de divisões, têm o tamanho ideal para a vida isolada. A solidão e o isolamento são também as condições da maioria destes casais que vivem distantes da restante família.
O que muitos não conseguem ver é que na velhice não vivemos menos, mas vivemos de forma diferente. A terceira idade pode ser o tempo da disponibilidade, qualidade cada vez mais rara nas nossas vidas tão preenchidas. Tempo para se dedicar aos outros, mesmo que sejam apenas os familiares mais próximos. Há tantas coisas que se pode fazer pelos outros, desde o fazer companhia ao ser cuidador do outro com mais necessidade. E de graça. Há mais tempo para amar...
O Papa Francisco falou da velhice como uma época de dom e diálogo. Tempo para experimentar a dimensão da gratuidade e, portanto, da inteligência do coração. Pode-se e deve-se olhar para a velhice de uma maneira nova. É o tempo da liberdade, do amor e da amizade desinteressada, o tempo de aceitar as nossas fraquezas e ajudar até quem não é velho. É a época que traz à tona a primazia do ser sobre o ter e que tanto tem a ensinar à nossa sociedade, globalizada mas ao mesmo tempo tão pobre de referências.
Ps: Amanhã celebraremos a memória dos “avós de Jesus”. Não há nenhuma referência na Bíblia e notícias certas sobre Joaquim e Ana, pais de Maria. As informações existentes foram tiradas dos textos apócrifos, como o Protoevangelho de Tiago e o Evangelho do Pseudo-Mateus, além da tradição. Sabe-se que ambos moravam em Jerusalém. A princípio, apenas Santa Ana era comemorada e, mesmo assim, em dias diferentes no Ocidente e no Oriente. Porém, em 1969, após o Concílio Vaticano II, os pais de Maria passaram a ser celebrados numa única data, 26 de julho.