Recuperar o olhar, a visão, o espanto...

Crónicas 31 dezembro 2024  •  Tempo de Leitura: 3

Mais um ano! Tempo para balanços. Na liturgia já vivemos o novo ano desde o primeiro domingo de Advento. E desde a noite de Natal, num novo Ano Jubilar

 

A celebração do Jubileu é um tempo de graça que a Igreja nos dá, convidando-nos a vivê-lo com um coração reconhecido e cheio de gratidão. 

 

Esta graça deve ser vivida pessoalmente e como comunidade. Só assim o Jubileu deixará uma marca indelével na nossa existência cristã. É-nos oferecida uma outra possibilidade de conversão que não deve ser desperdiçada nem vivida superficialmente. É uma nova oportunidade de regressar ao amor verdadeiro, a um seguimento cristão mais autêntico, fundado na fidelidade de Deus: este é o fundamento da esperança!

 

Somos chamados a mergulhar no banho da misericórdia reconhecendo as nossas carências pessoais, comunitárias e sociais para continuar o caminho da vida, fortes na fé e na esperança.

 

No Corriere della Sera do passado dia 24, o filósofo Massimo Cacciari, afirmava sobre o Jubileu:

«Certamente não para celebrar. A etimologia é inventada mas bela, o Jubileu é uma boa notícia que deveria fazer gritar de alegria, momento de conversão que produz resultados concretos como o perdão das dívidas. E em vez disso..." E o problema não é a secularização, mas a descristianização.

 

«No facto de as palavras de Jesus já não serem ouvidas. Podes muito bem não acreditar em Deus, não acreditar que Jesus é o Lógos que está com Deus, etc., mas as suas são palavras de uma figura histórica, pronunciadas e transmitidas. A “morte de Deus” à la Nietzsche não tem nada a ver com isto. São as palavras do Evangelho, das Bem-aventuranças, do Samaritano, que hoje se calam».

 

Não sou tão pessimista. Creio, tal como o padre Jesuíta Paolo Gamberini, que “o cristianismo moralista parece ter chegado ao seu fim no Ocidente: não conseguiu salvar nem o mundo fora da igreja nem o mundo dentro da igreja. Até as cordas utilizadas para flagelar e purificar o templo de Deus estão gastas.”

 

Que, para muita gente, Deus já não interessa, quer esteja vivo ou morto, quer tenha nascido ou nunca encarnado. Estamos a entrar em outra era, onde a morte de Deus proclamada por Nietzsche está completamente ultrapassada.

 

«É tempo de ouvir. É tempo de desenterrar o tesouro escondido debaixo da terra daqueles que fugiram do templo. É tempo de remover as cinzas de um Ocidente reduzido a pó, de reacender o fogo adormecido, mas não extinto, no homem. É necessário restaurar a visão, o olhar de Deus sobre o mundo. Não “fazendo” algo, mas recomeçando a partir do centro. Não do centro do cristianismo – Roma – nem dos subúrbios degradados. Do centro de nós mesmos.» 

 

Aqui está o nosso caminho, o nosso ano jubilar: recuperar o olhar, a visão, o espanto, porque o Evangelho é uma voz. Uma voz que grita no deserto.

 

Votos de um Bom Ano!

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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