Os sistemas binários vivem de duas hipóteses apenas. Por exemplo, um bit só pode ter o valor de zero ou de um. Porém, uma elipse existe se tiver dois pontos focais distintos. Pois, se esses pontos estiverem na mesma posição, a elipse converte-se num círculo. A sigla IA é uma realidade elíptica.
A maior parte das pessoas interpreta a sigla IA como "Inteligência Artificial". Porém, como ferramenta que altera o alcance do nosso pensamento crítico, IA poderia ser, também, a sigla para "Inteligência Ampliada". São visões da inteligência que apontam para dois pontos focais.
Quando nos referimos a IA como Inteligência Artificial, o ponto focal da elipse está na máquina. Porém, ao nos referirmos a IA como Inteligência Ampliada, colocamos o ponto focal no ser humano. É como um íman onde os dois pólos (negativo e positivo) são a forma de criar um campo magnético, como o terrestre que nos protege da radiação do espaço. Se interpretarmos a IA como o campo cognitivo formado pelos pólos do ser humano e da máquina, protegemos a diversidade intelectual como força motriz da evolução cultural.
Se houvesse domínio de um ponto focal sobre o outro, perderíamos a protecção do campo cognitivo. Se a máquina dominasse sobre o ser humano, a inteligência seria reduzida a uma visão cultural média de tudo o que nós criámos de bom e de mau, deixando de haver qualquer espaço para evoluirmos na direcção de algo novo e original. Isto para além do pensamento crítico ser uniformizado e perdendo-se ao longo do tempo.
Se o ser humano dominasse sobre a máquina, a inteligência seria reduzida à limitada capacidade biológica de domínio cerebral para lidar com assuntos de elevada complexidade, desgastando o potencial criativo humano na burocracia que procura responder à necessidade de organizar a vida social.
A máquina é uma experiência humana que revela sermos co-criadores com Deus. A máquina não foi criada para dominar a nossa vida, mas ampliar a liberdade de mover, pensar, criar, reflectir, fazendo da vida intelectual uma sequência de actos de amor quando dignificam a pessoa e a sua relação com o mundo. O campo cognitivo criado pelos pontos focais da Inteligência Artificial e da Inteligência Ampliada é a manifestação de como a unidade do tecido da realidade pressupõe a diversidade que não divide, ou separa, mas beneficia da distinção.
Hoje, estes pontos focais começam a evidenciar-se como jamais aconteceu na história humana. Porém, este campo cognitivo elíptico que ganha forma entra num período da história onde sentimos o emergir de uma nova oligarquia assente, precisamente, no poder das tecnologias de informação. Poucos querem dominar a atenção de muitos e estão dispostos a fazer confluir os pontos focais, num só ponto dominado pela Inteligência Artificial que eles pensam dominar. É preciso proteger a inteligência em elipse.
Por mais estranho que pareça, creio que a forma de manter o campo cognitivo elíptico que nos protege da uniformização intelectual está em duas coisas: no contacto com o mundo natural; e na valorização da nossa vida intelectual.
É essencial reconhecer que a nossa natureza humana assenta no mundo natural. Quanto mais tempo despendermos em interacção com a tecnologia, mais nos desligamos do contacto com o mundo natural onde se desenha a inteligência em elipse. As nossas raízes estão no mundo natural como tela em branco onde pintamos a nossa evolução cultural. Por isso, aumentarmos o tempo de contacto com a natureza é uma forma de proteger o campo cognitivo da IA (no sentido elíptico com dois pontos focais).
A valorização da nossa vida intelectual passa por mantermos a postura de estarmos sempre a aprender para o resto da nossa vida. No meu livro "Tempo 3.0" reconheço que o ponto de viragem que actualiza a nossa experiência do tempo está em nos tornarmos grandes apreendedores. Pessoas que continuam a desenvolver o gosto por saber aprender. Só o tempo dirá se tivemos a coragem de manter a inteligência em elipse. Oxalá.