Semana (de) Maior (sofrimento)?

Crónicas 27 março 2018  •  Tempo de Leitura: 4

Por que é que a Igreja "dedica" tanto tempo ao sofrimento? Por que é que "cultivamos" tanto a dor, o sacrifício?

 

A Semana Maior do Cristianismo é aquela que nos conduz à Páscoa. Celebramos a Paixão e a Morte de Jesus . Devemos associar a esta semana todo o sofrimento da humanidade, e este a Jesus Cristo. Não há Páscoa sem Morte. Mistério central da Fé em Jesus Cristo. A vida é este dinamismo entre o sofrimento e a felicidade, entre a morte e a vida.

 

Nesta semana somos convidados a intuir o mistério e a profundidade da dor de Jesus, num acontecimento dramático no qual Deus, "age" com toda a sua divindade e toda a sua humanidade. Jesus na sua paixão, não finge sofrer. Ele vive em si o drama do ser humano.

 

O Deus de Jesus, não nos tira a dor, o sofrimento, a morte, mas pede-nos para os "abraçar". Não dá anestesia nem adoça os momentos dramáticos. O Deus de Jesus, quer-nos livres e dignos, responsáveis e conscientes do nosso próprio ser e da nossa existência, aqui e agora.

 

Porém, este dinamismo, não é compreensível em si mesmo sem Amor.  Talvez, nestes dias, sejamos capazes de perceber melhor este dinamismo, com a tragédia de Carcassonne e Trèbes, França. Só compreendo a morte do Tenente-Coronel Arnaud Beltrame, com os "olhos" do amor. Alguns dirão que foi o cumprimento do dever. No entanto, para mim, este "dever" estava inscrito na vocação deste policia ao serviço dos outros. Este homem vivia uma conversão. Só aos 33 anos foi batizado e preparava-se para casar pela igreja.

 

O ato de entrega que vemos na cruz, é revelador do que animou toda a vida de Jesus e que lhe "permite atravessar" a morte com extrema confiança na fidelidade do Pai. O Amor é mais forte do que a morte! O ato de entrega de Beltrame, também é revelador da fidelidade ao dever para com os seus cidadãos e, de um amor maior que se doa. Não existe ato mais corajoso, mais altruísta e mais heróico que dar a própria vida para salvar outra.

 

A Força de Deus, mostra-se na fragilidade e na debilidade...  

 

Somos chamados a permanecer numa relação com Deus que guarda a nossa existência e que a continua a habitar mesmo nos momentos que nos parecem de abandono, de provação e de sofrimento. Jesus continua a confiar no Amor, não quer violência nem a "lei da força", mas continua abandonar-se inteiramente nos braços do Pai.

 

Esta deve ser a experiência da Igreja ou de cada um de nós, crentes, quando assumimos o escândalo da cruz e o rosto de um Deus humilde e humilhado. Um amor que não se impõe com violência, não usa os milagres para cativar. Não quer fazer espetáculo, mas que se propõe, que se oferece, que se dá...

 

Um Deus de uma humanidade incrível...

 

É pois na realidade mais sofredora e humilhante que se revela este Deus. É nesta que é a realidade humana que Deus nos diz: «Não te preocupes. Não é o fim!». A Páscoa é o "fim" da nossa vida. Quando parece que celebramos o sofrimento, o que queremos celebrar verdadeiramente é a vida que surgiu e continua a surgir do Amor.

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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