Vai com cuidado!

Crónicas 31 maio 2017  •  Tempo de Leitura: 3

Na dúvida, não duvides. Crava os pés e as mãos nas certezas que foram sempre tuas.

 

Na mágoa, não magoes. Priva o coração de sentir igual ao que te fizeram sentir a ti.

 

Na tristeza, não entristeças. Separa as águas e não deixes que se misturem. Não deixes que te misturem. Separa as marés de dentro e guarda sempre espaço para ser feliz.

 

Na queda, não faças cair. Olha para os dois lados antes de atravessar. Antes de atravessares a vida de alguém.

 

Na raiva, não te deixes arder. O que hoje queima e destrói, amanhã pode ser cicatriz que ensina.

 

Parecem palavras fáceis de escrever. Não são. Parecem palavras fáceis de praticar. Não são. Se pensarmos bem, o nosso coração até domina as teorias sobre o que deve ou não fazer. É fácil dizer aos outros para não desistirem, não duvidarem, não caírem, não deixarem, não perderem, não se zangarem. Fácil, é. Mas nem sempre é possível. Na dúvida, estamos muitas vezes com sede de respostas rápidas. Não conseguimos perceber que as dúvidas não se resolvem nem dissolvem com pressas. Na mágoa, nem sempre conseguimos não magoar os que são nossos. Deixamo-nos encher de um ar ferido e, quando respiramos, ferimos os outros. Assim, quase sem dar conta. Na tristeza, é fácil pintar um quadro escuro e acreditar que o tempo está a passar devagar de propósito. Só para nos deixar ainda mais tristes. Na queda, fazemos cair. Arrastamos os outros connosco porque não nos apetece cair sozinhos. Na raiva, queimamos bondades e alegrias por ficarmos cegos com aquilo que nos fizeram.

 

Parecem palavras fáceis de escrever. Não são. Parecem palavras fáceis de praticar. Não são. Nem sempre conseguimos fazer o que seria suposto. Nem sempre nos é possível avançar com coragem e com vontade. Nem sempre é possível não duvidar. Mas, ainda assim, há uma possibilidade que espreita. É possível adivinhar uma fresta de luz mesmo quando não nos é possível ter brilho. Essa fresta que espreita e que nos acende é o amanhã.

 

É o dia de amanhã que nos consola. Que nos acalma e nos sossega. Amanhã será sempre melhor. Vou saber mais do que sabia ontem. Vou saber melhor do que sabia no dia anterior. É o amanhã que nos faz chorar de alegria. Essa promessa por nascer que nos embala os dias maus e nos faz acreditar em impossíveis.

 

É para o dia de amanhã que vamos. Vamos a caminho do dia de amanhã. E poder chegar lá é uma responsabilidade incrível.

 

Vamos a caminho do dia de amanhã. Na dúvida, vai (sempre) com cuidado.

Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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