Precioso

Crónicas 12 março 2020  •  Tempo de Leitura: 2

«Veio até mim, é meu, meu amor, meu precioso.» (Gollum no Senhor dos Anéis)

 

Na obra de Tolkien, o anel foi criado pelo feiticeiro Sauron para subjugar todos os povos da Terra-Média. Sempre entendi esta história como uma fantasia. Nunca pensei que pudesse encontrar na minha vida um anel com este poder até me confrontar com… o tempo.

 

O tempo pode unir ou subjugar. Se cuidarmos bem do nosso tempo e de como o gastamos, une os diversos acontecimentos da nossa história num fio condutor que lhe dá sentido e significado. Mas se andamos atrás do tempo e, por isso, nos queixamos sistematicamente da sua falta, subjugámo-nos a esse, bem como os que nos rodeiam.

 

«O tempo é feito para o homem, não o homem para o tempo.» (A núvem do não-saber, Desconhecido)

 

Quem vive para o relógio, subjugou-se ao anel do tempo. 

 

Quem vive para o momento presente, uniu-se ao fluir do tempo. 

 

Lembram-se daqueles momentos em que nos embrenhamos em algo de tal modo que nada mais importa? É uma experiência tão agradável que realizamos seja o que for pela simples razão de realizar, não importa quão elevado seja o preço. É o estado de fluir. É a consciência plena de ser o momento presente que sustenta cada passo no caminho pessoal que nos constrói e faz diferentes.

 

O tempo é um bem universal que nem o homem mais rico do mundo consegue comprar. A não ser quando compra o tempo dos outros. Todos temos o tempo que temos, mas não o possuímos. Muitas vezes são os outros que possuem o nosso tempo. Daí que a experiência do tempo possa ser libertadora quando vivemos bem o momento presente, ou subjugadora quando vendemos ou cedemos o nosso tempo aos outros sem critério.

 

O único acto salvador da Terra-Média para evitar a subjugação do anel era destruí-lo. Mas não podemos destruir o tempo, apenas nós próprios quando não lhe prestamos suficiente atenção e cuidado, e desperdiçamo-lo. Mas do mesmo modo que a destruição do anel de Sauron implicou que esse voltasse a fluir com a lava da Montanha de Fogo, talvez o que merece ser destruído seja o desperdício de tempo para que esse volte a fluir e nós com ele.

Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
Acompanhe os escritos do autor subscreveendo a Newsletter  Escritos 

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail