Pensava

Crónicas 16 abril 2020  •  Tempo de Leitura: 3

Pensava que não passava de um momento efémero do quotidiano, mas tornou-se mais. Tornou-se epidémico. 

 

Pensava que ser livre era estar onde quisesse, com quem quisesse, a fazer seja o que for. Mas agora ser livre é ser responsável e abdicar de tudo isso.

 

Pensava que a casa era o lugar de chegada, onde poderia repousar após um dia árduo de trabalho. Mas a casa tornou-se o lugar onde estou confinado para segurança dos mais próximos e dos outros a quem não queremos contagiar, ou ser por eles contagiados.

 

Pensava que “a pensar morria um burro”, mas agora pensar é o que mais podemos e temos tempo para fazer. Mas isto não é o fim. Apenas o início de um modo novo de ser “normal”.

 

Sabemos que o mundo não será o mesmo e receamos, mas digo que o único receio a ter é o de não aproveitarmos esta oportunidade para dar vida a um estilo de vida diferente.

 

Já reparaste como o canto dos pássaros se eleva na cidade? Já reparaste nas oportunidades de ler mais, rezar mais e participar mais da vida familiar?

 

Sei o quanto custa saber que há pessoas a sofrer e entes que partem sem que outros lhes possam dar o último adeus. O sofrimento faz parte da vida porque sem esse, a vida não tem perspectiva de evoluir. O sofrimento é o reconhecimento da nossa fragilidade, do facto de sermos limitados e termos uma só vida. 

 

Não há palavras capazes de expressar o que algumas pessoas estão a viver quando afectadas directamente na sua carne por esta pandemia. Apenas o silêncio pode cantar a melodia que nunca desafina, mas cria o espaço para afinar as dissonâncias que tornavam a nossa vida menos do que poderia ser. 

 

Pensava que tudo poderia ter sido diferente se estivéssemos mais bem preparados e podemos pensar que este é o único desafio que antevemos pela frente. Mas não é. 

 

Há algum tempo que sabemos como o planeta tem o seu clima alterado via o nosso estilo de vida insustentável. A diferença é que este vírus levou-nos a um acidente de carro do qual podemos e esperamos recuperar. Mas o desastre climático será como um acidente de comboio. Perdendo o controlo e descarrilando, não haverá recuperação possível. 

 

Pensava que iríamos aprender com os nossos erros e tenho esperança de que isso seja ainda verdade.

Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
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