Sinais

Crónicas 21 janeiro 2021  •  Tempo de Leitura: 6
Os sinais estão à vista. Sinais de trânsito, sinais na cara, ou seja, elementos evidentes que marcam. Quando usamos sinais para nos ajudar a caminhar por onde queremos, precisamos de estar atentos para os ver, mas não chega. É importante saber o que significa cada sinal. Há muitas semanas que diversos especialistas nos avisam dos sinais que representam o número de novos infectados com a Covid-19 e, infelizmente, o número de pessoas que não consegue sobreviver. Por que razão estamos tão lentos a interpretar os sinais e a agir?

Muitas pessoas viveram experiências traumáticas com o confinamento em março de 2020. As crianças com menos recursos informáticos sentiram-se marginalizadas no ensino. Agimos, rapidamente, para conter a pandemia por ser a primeira vez que estaríamos a viver algo assim. Agimos pela prudência diante dos sinais e, a verdade, é que o esforço produziu algum efeito. Mas agora, com mais experiência e recursos (máscaras, hábitos de higienização, etc.), parece que a margem de segurança se alargou e diante dos sinais (alguns mais perigosos do que no ano passado), parece termos medo de decidir pelo confinamento, e muitos grupos parecem não ligar aos cuidados a ter, desrespeitando o apelo de evitar os ajuntamentos. O preço do desleixo e da indecisão está a ser pago, e é caro. O que nos falta aprender?

Imaginem-se sem telemóvel ou bússola e encontram-se no meio de um trilho numa floresta. As nuvens adensam-se, movem-se, e o vento fortalece. Não são estes sinais de que talvez seja sensato voltar para o abrigo? 

No carro a luz do combustível acende-se. Não será um sinal de alerta de que será sensato abastecer na próxima estação de serviço? 

Sentimos um aperto na barriga, o sol está alto, pelo que deveremos estar próximos das 12h. Não será um sinal de que está na altura de almoçar? Os sinais alertam-nos, e guiam-nos nas decisões (grandes e pequenas) a tomar ao longo do dia.

Uma vez ouvi uma entrevista do médico Fernando Nobre sobre como não havia já pandemia. Percebi como muitas pessoas acreditavam nele e achavam que tudo o que se estava, ainda, a fazer, como o distanciamento físico, as máscaras, e a higienização eram um exagero. Depois, outras pessoas começaram a questionar a segurança da vacina pela rapidez com que foi desenvolvida, embora esse argumentos fossem, sistematicamente, desmistificados na comunicação social. E agora? Pensam o mesmo?

Se não estivéssemos no meio de uma pandemia, não haveria um crescimento como este de novos infectados, e não morreriam tantas pessoas como está a acontecer. Depois, todos desejam que a ciência dê respostas cada vez mais rápidas aos problemas que vivemos. E agora que o fez, as pessoas desconfiam. Ridículo.

Por fim, o número de novos casos incide, particularmente, sobre os jovens universitários. Nos corredores das faculdades e departamentos, vejo os alunos amontoados a aguardar para entrarem no exame, sem qualquer respeito pela distância física. Ou no exterior, tomam a sua cerveja, riem, e sinto estas atitudes como um profundo desrespeito por todas as famílias que vêem os seus entes queridos partir. Não vêem os sinais?

Há dias partilharam-me um vídeo de alguém num país de língua espanhola a dirigir-se a uma pessoa de um grupo (sem o distanciamento adequado e sem máscara) para falar da campanha que estão a fazer de sensibilização para o uso da máscara. De repente, após ter feito a síntese da campanha, o entrevistador já uma bofetada na pessoa e diz — «então não usa a máscara como nos é pedido? Não sabe quantas vidas estão em perigo pelo nosso desleixo?»Não me recordo se usou, precisamente, estas palavras, mas seriam nesta linha. Parece engraçado, mas não é. Aliás, considero este video uma sátira ao que dá vontade de fazer quando vemos em terminadas pessoas estes sinais de desleixo, tal como as crianças cuja bofetada serve para quebrar o ciclo vicioso de choro e rabugice em que se encontram. Creio que há formas menos violentas de ajudar as pessoas a ver os sinais e a respeitá-los. Mas será que estou errado? 

É possível olhar os sinais e não os ver? Sim. Se estivermos distraídos e com a cabeça imersa em realidades virtuais, sim, é possível olhar e não ver. Mas está na altura de despertar. 

O futuro dos mais frágeis quando atingidos por esta pandemia está na capacidade de estarmos atentos aos sinais, interpretá-los e não perder tempo para agir. E não tenhamos receio que chamar a atenção dos outros para as distracções (sem bofetadas, se possível). Pensemos nas vidas que estaremos a salvar com cada chamada de atenção para os sinais.

 
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Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
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