Confinem as más notícias, por favor!

Crónicas 10 fevereiro 2021  •  Tempo de Leitura: 2

Não sei se é de mim, mas já suporto muito pouco do que vai sendo transmitido nas notícias.

 

Já não nos basta sentirmo-nos permanentemente acocorados no mesmo lado das trincheiras, ainda temos de ouvir os ruídos desta guerra ecoar perpetuamente dentro dos ouvidos, dos pensamentos, da normalidade possível que vamos tentando imprimir em cada dia.

 

Já não nos basta perceber que as vacinas que nos vinham salvar, afinal só vão salvar os do costume, ainda temos de ouvir (em modo disco estragado) as mesmas vozes ruminadas, mastigadas, atarantadas.

 

Já que estamos em modo de confinamento, que se confinem também as notícias que impedem esta tragédia de acabar. Que não se repita até à exaustão o que ouvimos há quase um ano.

 

Não haverá histórias dos bons para contar? Só há espaço e tempo para os que fintam as regras?

 

Não haverá, por aí, quem mereça melhor uso do tempo de antena?

 

Estamos quase a celebrar um aniversário do tsunami-covid que avassalou as nossas vidas. Como é que o queremos viver?

 

Queremos definhar moralmente enquanto julgamos que os que vencem são os que guardam as vacinas para os amiguinhos?

 

Queremos engolir de vez a pouca compaixão que nos resta e acreditar que não há bem nenhum a nascer de tudo isto?

 

É uma escolha que podemos fazer, essa de optar por ficar do lado de quem só encontra casa onde há escuro.

 

Eu quero continuar a fazer casa do lado da luz. Do lado dos que sabem que o Bem (quase) nunca é notícia, mas que não deixa de ser o mais importante de todos os lados desta guerra.

 

Eu quero continuar a fazer casa do lado do sol, que parece ter hibernado do nosso país.

 

Eu quero continuar a sonhar com as viagens que vou fazer, com os encontros de voz embargada nos cafés e nos restaurantes de sempre, com os abraços que vou dar, com a liberdade, com o dia em que vamos queimar todas as máscaras, com aquilo que ainda seremos depois de nos terem amputado o coração.

 

E será tanto. E seremos tanto.

Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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