E tu, quando é que descansas?
O descanso continua a ser um elefante no meio das nossas salas. Acena-nos. Tenta que lhe prestemos atenção. Derruba a nossa concentração, a nossa memória a curto prazo e nós, astutos, continuamos a ignorá-lo. Aliás, continuamos a ignorar ambos: o descanso e o elefante que ele representa.
Não descansamos para ter a certeza que ninguém duvidará da nossa competência e do nosso valor. Não descansamos para poder usar essa bandeira tatuada no peito e para hasteá-la diante dos olhos dos outros, que dominam (arrogantemente) a arte da preguiça e do lazer.
Não descansamos porque não conseguimos. Porque estamos mergulhados numa engrenagem que nos obriga a não parar. A não pensar. A não discernir sobre o que estamos a conseguir com as nossas atitudes e com o nosso estilo de vida.
Estamos reféns de um modo de vida que ninguém nos ensinou, mas que vimos ser repetido dentro de nós ao longo dos últimos dias, meses, anos, gerações. Estudamos para conseguir trabalhar. Trabalhamos para conseguir dinheiro. Trabalhamos mais para conseguir mais dinheiro. Quando deixamos de trabalhar das duas uma: ou somos demasiado velhos para usufruir da vida ou já não estamos cá para usufruir dela.
É só isto que queremos para nós? Resumir a vida a uma quantidade interminável de tarefas e de lutas diárias que rimam com produtividade e capacidade de (demasiado) trabalho? Não pode ser.
Ainda vamos a tempo de travar a fundo. De nos retirarmos dos contextos onde estamos reféns. Ainda vamos a tempo de legitimar o tempo de descanso. Ainda vamos a tempo de fazer as malas e encontrar espaço para aquilo que nos comove o coração. Seja isso o que for. Ainda vamos a tempo de começar a nossa história outra vez ou de a retomar a partir daquela última página dobrada num dos cantinhos do livro que somos.
Ainda vamos a tempo de fazer melhor. De cuidar do que somos e do que viemos, realmente, cá fazer: encontrar um sentido bonito para a nossa existência de cada dia.