Só neste país!

Crónicas 28 dezembro 2022  •  Tempo de Leitura: 3

Enquanto aceleramos o passo para dar, finalmente, a volta a 2022 e para atirar esta folha do calendário para trás das costas, nem nos apercebemos do caos em que continuamos a viver.

 

Vivemos num país pequenino. Em todos os aspetos, infelizmente. Onde se fala de milhões como se de moedas para a bica se tratasse. Onde se fala de crime e de histórias hediondas, alternadas com anúncios de pseudo união familiar. Onde se fala de doença com lágrimas nos olhos para depois ver em que estado está a saúde no Portugal dos pequeninos.

 

Vivemos no país do salve-se quem puder. Onde se normalizam os atrasos. E onde quem está mal é quem chega a horas. Como nos atrevemos a cumprir num país de desrespeitadores? Como nos atrevemos a franzir o sobrolho num país de palhaços de Cara Alegre?

 

Era o que faltava. Dizer que as coisas estão mal. Então ainda agora foi o Natal. Não digas nada. Não se fala para ninguém dar conta. Não se rebenta a bolha da hipocrisia, não vá alguém saber que estávamos todos juntinhos dentro dela.

 

Vivemos no país do “peço imensa desculpa, mas a Dra. está atrasada”, do “lamento imenso, mas vai ter de pagar, mesmo que a culpa não seja sua”, do “não posso fazer nada, foi o meu chefe”, do “Não posso fazer nada, foi a minha colega”. E a culpa vai andando assim, de mão em mão, como um balão de feira sorridente. Que há de perder o fôlego (e o ânimo) ainda antes de chegar a porto seguro.

 

Vivemos no país do não há professores. Nem médicos. Nem enfermeiros. Mas não se pensa nisso agora que o nevoeiro faz menos mal aos olhos de quem não vê.

 

Vamos a caminho de 2023 e devíamos ser todos multados por excesso de velocidade. Está tudo virado do avesso (ainda) e parece que todos preferem dar a volta ao elefante na sala, do que olhar para ele.

 

Continuemos assim. Alienados do que nos faria bem. Alienados do que nos estão a tirar. Alienados do que podíamos fazer e não fazemos. Do quanto devíamos incendiar o mundo com as nossas queixas e reclamações. Podia ser que o fumo chamasse a atenção a quem de direito.

 

Já não sei se moro neste país ou se é este país que mora em mim. Qualquer uma das duas hipóteses me parece feita de migalhas bolorentas. Já ninguém as engole.

tags: Marta arrais

Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail