Fotografia-Memória

Crónicas 13 julho 2023  •  Tempo de Leitura: 4

Na festa dos tabuleiros em Tomar, uma amiga nossa tinha a oportunidade de tirar fotografias únicas com o seu telemóvel do sítio onde observava os pares a caminhar pela rua com os enormes e criativos tabuleiros na cabeça das mulheres enquanto os homens as acompanhavam. Porém, preferiu não fazê-lo por uma razão simples e intrigante: queria tirar uma fotografia-memória.



Uma fotografia-memória é uma imagem que capturamos na mente quando estamos realmente muito felizes. Fechamos os olhos e tiramos uma foto ao momento que estamos a viver. Assim, quando estivermos tristes, assustados ou nos sentirmos sós, podemos olhar interiormente para as Fotografias-Memória guardadas na mente e no coração.



Imaginem duas pessoas a desfrutar de um belo dia na água a pedalar numa gaivota e a alimentar patos com pão. De repente, uma delas pára de pedalar e fica perfeitamente imóvel no seu assento. A cabeça inclina-se para trás e mantém os olhos fechados. O sol brilhava no seu rosto e esboça um sorriso tranquilo nos lábios. A outra pessoa fica impressionada com a beleza do gesto e a sua vulnerabilidade ao ficar ali, inerte. O tempo passa e começa a ficar preocupada com a sua inerte amiga, até que notou o sorriso alargado quando ela reabriu os olhos e explicou que estava a criar uma Fotografia-Memória!



Uma fotografia-memória pode levar-nos a experimentar o passado como mais próximo, alterando a nossa percepção do tempo. Quando recordamos uma memória viva dentro de nós, podemos reviver cada evento como se tivesse acontecido recentemente, mesmo que tenha ocorrido há muitos anos.


Ao criar uma fotografia-memória, estamos essencialmente a fazer uma pausa para reconhecer e apreciar o momento presente, aumentando a consciência do aqui e agora. Isso pode ajudar-nos a sentir que estamos a viver mais plenamente o entrelaçar de narrativas que dão sentido à nossa história.


As fotografias-memória também podem influenciar a forma como antecipamos o futuro. Por exemplo, uma memória viva dentro de nós de um evento agradável, pode orientar as nossas decisões relativamente a experiências semelhantes que possamos fazer no futuro.


As fotografias-memória podem ajudar-nos a criar uma sensação de continuidade ao longo do tempo, ligando o passado, o presente e o futuro. Sem termos essa intenção, elas servem de pontos de referência na nossa linha pessoal do tempo.



Nunca percebi a razão das pessoas dizerem aos esquecidos que comeram muito queijo. Talvez uma importação britânica do ditado de que “queijo à noite dá pesadelos.” Estranho porque todas as fotografias-memória que tenho de queijo são todas saborosas. 



As fotografias-memória morrem connosco? Sim se não forem partilhadas. A cultura humana vive das fotografias-memória que nos deixaram os pintores, poetas, músicos porque muitas das sua obras levaram tempo a fazer e só puderam completar-se pelo contínuo recordar daqueles momentos significativos para o artista. As fotografias-memória são o húmus das histórias que partilhamos uns com os outros. Não são coisas, mas também não são não-coisas como as fotos digitais que não dependem de um meio específico para existirem. Da próxima vez que te sentires feliz, fecha os olhos e tira uma foto-memória. Mas não fiques por esse acto interior. Quando for oportuno e estiveres diante de um amigo ou familiar, partilha-a.

 


Para acompanhar o que escrevo pode subscrever a Newsletter Escritos em https://tinyletter.com/miguelopanao

Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
Acompanhe os escritos do autor subscreveendo a Newsletter  Escritos 

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail