Qual é a lógica do Perdão?
O perdão associado à matemática sempre me deixou curioso. Sabemos que o número 7 na Bíblia, transmite-nos a ideia de totalidade, conclusão, perfeição e consumação. Mas de onde vem o 70?...
Pedro, talvez inspirado no Livro dos Provérbios onde se diz que Deus perdoa sete vezes por dia, achava que estava a ser generoso ao propor o total de 3 perdões a quem o ofendeu. Mas a resposta de Jesus é que é verdadeiramente neotestamentária. Ou seja, o homem novo, o ser humano nascido da paixão, morte e ressurreição de Jesus, perdoa sempre.
A resposta de Jesus propõe exatamente o contrário daquilo que, ainda no Antigo Testamento, diz Lamec:
«Ada e Sela, ouvi a minha voz, mulheres de Lamec, escutai a minha palavra: Eu matei um homem por uma ferida, uma criança por uma contusão. É que Caim é vingado sete vezes, mas Lamec, setenta e sete vezes!» Génesis 4,23-24
A lei de Lamec é vingança até ao fim. Jesus contrasta esta lei com a do perdão total. Devemos perdoar setenta vezes sete, sempre.
A primeira é a lógica terrível do ódio e da vingança. É a lógica da violência: violência atrai violência! Pensemos em certos ódios que agitam as nossas famílias, as nossas amizades ou nos nossos locais de trabalho. Muitas vezes por disparates... Ou, num contexto completamente diferente, a terrível lógica da guerra que sangra em algumas partes da terra. Os grupos de trafico humano ou das drogas... Situações diferentes mas a mesma lógica.
A violência é um sinal de fraqueza. A violência domina-nos, não somos nós que a dominamos!
A verdadeira força pertence a quem sabe dizer não a esta lógica e revertê-la para o seu contrário: o perdão.
O perdão é um ato de força. E parte de uma observação muito simples: tudo nos foi dado. Tudo recebemos: a vida, o bem das pessoas que nos amam, o trabalho, a sociedade e os seus serviços, por mais deficientes que sejam... tudo nos é dado. Recebi, muitas vezes sem ter direito, dou sem ser obrigado...
Este é o mecanismo que está na base do perdão. É esta a lógica de Deus. A lógica que vem do alto.
Muitas vezes confundimos esta ação divina com filantropia autêntica, mais frequentemente como sinónimo de bem-fazer. Outras vezes como fruto de um itinerário psicológico bem-sucedido.
No entanto, o perdão cristão vai além destes aspetos, sem contudo excluí-los. É um dom que desce do alto, um dom de alto preço, que custou a vida do Filho de Deus. Com a sua Páscoa tornou-o universal, reconciliando-nos com o Pai e uns com os outros.
O problema é que nós, que recebemos tudo, somos como o servo da parábola a quem lhe são perdoados os 10.000 Talentos. Sempre fomos perdoados. Somos capazes de perdoar algumas vezes? Ou somos como o filho mais velho da parábola do filho pródigo, convencidos de que temos muitos méritos e muitos direitos?
Se fizermos isto, se partirmos do que fizemos e do que os outros devem fazer por nós, nunca compreenderemos a lógica do perdão.
O perdão também é uma questão de fé. Todos somos devedores, portanto, todos devemos perdoar.